Vol. XV: Vitrais 99 - ago 2022 

A Revista da ABRT Associação Brasileira Ramain-Thiers

ISSN 2317-0719

VITRAIS
Vol. XV: Vitrais 99 - ago 2022

 

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Literatura

 

Textos de Aristóteles

 

Por: André Vergez e Denis Huisman

 

AS QUATRO CAUSAS

Esse texto, extraído da Física, distingue a causa material,a causa formal, a causa eficiente e a causa final.

Num sentido, a causa é aquilo de que uma coisa é feita e que lhe permanece imanente; o bronze, por exemplo, é a causa da estátua. Em outro sentido, ela é aquilo e que advém o primeiro começo da mudança ou do repouso; o autor de uma decisão, por exemplo, é causa, o pai é causa do filho e, em geral, o agente é causa daquilo que é feito, o que produz a mudança do que é mudado. Em último lugar, é o fim, isto é, a causa final; a saúde, por exemplo, é causa do passeio; de fato, por que ele passeia? É por causa de sua saúde, diremos. Com essa resposta, pensamos ter dado a causa. Entenda-se, também pertence à própria causalidade tudo aquilo que, movido por algo que não si mesmo, é intermediário entre esse motor e o fim; no caso da saúde, por exemplo, o emagrecimento, a purgação, os remédios e os instrumentos, pois todas essas coisas visam a um fim e só diferem entre si como ações e instrumentos.

 

A SORTE E O ACASO

Aristóteles, mostra, com sutileza, que essas noções traduzem uma falsa aparência de finalidade. Aparência de intenção humana (é a “sorte”) quando um credor encontra seu devedor sem o procurar, com se o tivesse feito. Aparência de finalidade natural (é o acaso) quando um tripé, lançado ao ar, cai fortuitamente sobre os próprios pés (como se fosse um fenômeno finalizado). Bergson seguirá Aristóteles muito de perto quando escrever em As duas fontes: “O acaso é o determinismo que se comporta como se tivesse uma intenção”.

Quando um caráter acidental se apresenta nos fatos que são produzidos em vista de um fim, fala-se, então, de efeitos de sorte e de acaso. Mais adiante estabeleceremos a diferença entre essas duas coisas; limitemo-nos, no momento, à verdade evidente de que elas pertencem às coisas às quais se aplica a determinação teleológica. Por exemplo: Um homem poderia, se soubesse, dirigir-se a certo local para receber seu dinheiro, uma vez que seu devedor está ali,  recebendo o montante de uma  subscrição; o credor vai a esse lugar, mas não por isso; porém aconteceu-lhe acidentalmente, tendo vindo, ter vindo para receber seu dinheiro; e isso não porque ele frequente esse local muitas vezes ou necessariamente; e o fim, isto é, o saldo da dívida, não se inclui entre as causas finais imanentes, mas depende de escolha e de pensamento; nessas condições, então, diz-se que ele foi ao tal lugar por efeito da sorte.

Se, pelo contrário, tivesse ido por escolha e visando a esse fim, porque frequentasse o lugar constantemente ou porque ali recebesse seu dinheiro em várias ocasiões, não haveria efeito da sorte.

Vê-se, então, que a sorte é uma causa acidental que advém às coisas que, tendo em vista algum fim, dependem da escolha.

Por outro lado, fala-se de boa sorte quando ocorre um bem, de má sorte, quando é um mal; de boa fortuna ou infortúnio, quando esse bem e esse mal são consideráveis; em consequência, quando alguém por pouco sofreu um grande mal ou experimentou um grande bem, fala-se ainda em boa fortuna ou infortúnio; isso porque o pensamento os considera como existentes, achando que, por pouco, não passa de um desvio nulo. Além disso, a boa fortuna, diz-se é coisa pouco segura e com razão; pois a sorte não é certa; pois nenhum efeito da sorte pode ser sempre, nem frequentemente.

Resumindo, como já dissemos, a sorte e o acaso são causas acidentais para coisas susceptíveis de não se produzirem absolutamente, nem frequentemente e, além disso, susceptíveis de serem produzidas em vista de um fim.

 

DIFERENÇA ENTRE O ACASO E A SORTE

Mas ambos diferem no sentido de o acaso possuir maior extensão; de fato, todo o efeito da sorte é casual, mas todo acontecimento casual não é sorte. Desse modo, existe sorte e efeitos da sorte, em tudo aquilo que pode ser atribuído à boa fortuna e em geral, à atividade prática. Assim é que só nos objetos da atividade prática é que necessariamente existe sorte. Uma prova disso é que a boa fortuna é, ou quase é identificada com a felicidade; ora, a felicidade é uma certa atividade prática, uma vez que é uma atividade prática bem-sucedida. Em consequência, os seres que não podem agir praticamente não podem produzir qualquer efeito da sorte. Daí resulta que nenhum ser inanimado, nenhum animal, nenhuma criança são agentes de efeito da sorte por não possuírem a faculdade de escolher; ademais não são susceptíveis de boa fortuna ou de infortúnio, a não ser por metáfora; assim é que Protarco dizia que as pedras de que são feitos os altares gozavam de boa fortuna porque são sacralizadas, ao passo que suas companheiras são pisoteadas. Em compensação, essas coisas podem, de algum modo, sofrer efeito da sorte quando aquele que sobre elas exerce sua atividade prática age por efeito da sorte; de outro modo não seria possível.

Quanto ao acaso, ele pertence aos animais e a muitos seres inanimados; assim, diz-se que a chagada do cavalo é um acaso, quando, por ela, ele encontrou a salvação sem que esta última tivesse sido visualizada. Outro exemplo: a queda do tripé é um acaso se, após queda, ela fica sobre os pés para servir de assento.

Em consequência, quando, no domínio das coisas que ocorrem absolutamente visando a um certo fim, acontecem coisas sem ter em vista o resultado e tendo sua causa final fora desse resultado, fala-se então de efeitos do acaso; e de efeitos da sorte para todos os efeitos do acaso que, pertencendo ao gênero das coisas susceptíveis de serem escolhidas, atingem os seres capazes de escolha.

 

REFERÊNCIAS

VERGEZ, André; HUISMAN, Denis. História dos Filósofos ilustrada pelos textos. Trad. Lélia de Almeida Gonzalez. 2ª ed. Rio de Janeiro.  Freitas Bastos,1972. P. 48.