Artigo 1
Hiperatividade: Uma Abordagem Terapêutica na
Visão Ramain-Thiers
por: Helenice Soares da Silva
Pedagoga. Psicopedagoga
Clínica.Sociopsicomotricista Ramain-Thiers.
A hiperatividade vem se
tornando um motivo de preocupação entre os
profissionais da Educação, pois em geral se
associa a dificuldades na escola e no
relacionamento com as pessoas com as quais a
criança convive. As crianças são tidas como
“avoadas”, “vivendo no mundo da lua” e
geralmente “estabanadas”. Muitas têm também
um comportamento desafiados e opositivo
associado, não respeitando limites e
“enfrentando” ativamente os adultos. Esse
comportamento, geralmente confundido com
indisciplina, é característico da
hiperatividade, que atinge cerca de 5% das
crianças e adolescentes de todo o mundo,
segundo os estudiosos.
Há dois tipos de crianças
com hiperatividade:
— As que têm problema
escolar pela dispersão, desatenção e falta
de concentração e, em consequência do seu
comportamento, não conseguem atingir os
objetivos programados.
— Mas há os hiperativos
que têm um bom desemprenho escolar,
conseguem executar as tarefas de modo rápido
e eficiente, e assim ficam a atrapalhar as
tarefas dos colegas logo que terminam as
suas, incomodando-os. Este comportamento
gera uma insatisfação dos colegas, passando
a serem malquistas e até rejeitadas pelo
grupo.
A hiperatividade pode ser
percebida em várias fases do desenvolvimento
infantil. Pode ser observada já no lactente,
porém trona-se mais evidente quando as
crianças estão na fase pré-escolar ou
escolar, quando é preciso aumentar o nível
de concentração para aprender.
Três fatores principais
ajudam a distinguir o hiperativo de criança
que tem apenas um distúrbio de atenção mais
leve e daquela que busca apenas chamar a
atenção: a contínua agitação motora, a
impulsividade e a impossibilidade de se
concentrar, seja em brincadeiras ou em
atividades pedagógicas. Essas atitudes devem
ser constantes durantes pelo menos seis
meses seguidos. O diagnóstico clínico deve
ser feito com base no histórico da criança,
e por isso a observação de pais e
professores é fundamental.
Os sintomas mais evidentes
que o hiperativo apresenta são:
·
ao brincar, não consegue se fixar durante
algum tempo em determinadas atividades ou
brinquedo, pois se desinteressa rapidamente
de um e sai à procura de outro;
·
não consegue ficar sentado à mesa durante as
refeições;
·
fala muito com os colegas;
·
interrompe a professora com frequência;
·
tumultua a classe com brincadeiras
inoportunas;
·
se expõe com muita facilidade a situações de
perigo;
·
não consegue assistir a um programa de TV,
ficando o tempo todo se mexendo;
·
é muito desorganizado em sua vida diária;
·
não consegue se manter em grupo;
·
faz perguntas o tempo todo e não espera a
resposta.
Embora com alguma
frequência inteligente e criativa, pode
apresentar notas baixas na escola ou então
desemprenho muito inferior ao esperado para
o seu nível de inteligência.
Quando se dedica a fazer
algo interessante (pode jogar videogame ou
assistir a um desenho animado), consegue
permanecer bem mais tranquila. Apesar da sua
atenção ser deficitária quando está fazendo
algo muito interessante ou estimulante, o
centro da atenção passa a funcionar como se
fosse normal.
Os estudos sobre as causas
da hiperatividade são ainda recentes, apesar
de que muito tem se pesquisado sobre este
assunto. Segundo os pesquisadores, existem
mais hipóteses do que certezas sobre as
reais causas do transtorno. Estudos parecem
indicar que o modelo mais aceito para
explicar as causas da hiperatividade é o da
hereditariedade, em que os familiares em
primeiro grau de crianças hiperativas também
apresentaram nas suas infâncias ou
adolescências os sintomas de desatenção,
hiperatividade ou impulsividade.
Estudos têm sugerido
também como causas: problemas durante a
gravidez ou no parto, problemas familiares,
aditivos alimentares, exposição ao chumbo, à
luz fluorescente, etc. Mas nenhuma destas
supostas causas jamais foi comprovada,
havendo mais hipótese do que certezas.
As intervenções precoces
podem representar um grande passo para
minimizar o impacto negativo que este
transtorno traz à vida da criança, dos pais
e dos professores. Este problema quando não
tratado pode associar-se a experiências
negativas de ordem social, pessoal, familiar
e escolar, permanecendo durante a
adolescência e a vida adulta.
É fundamental frisar que a abordagem do
transtorno exige intervenções múltiplas. Na
maioria das vezes, énecessária a combinação
das seguintes intervenções:
·
esclarecimento familiar;
·
intervenção psicoterápica;
·
intervenção Psicopedagógica e / ou de
reforço de conteúdos;
·
uso de medicação;
·
orientação para os professores;
·
algunsautores indicam as terapias
fonoaudiológica e psicomotora.
Como pode-se observar, a
hiperatividade traz repercussões sociais,
como a discriminação dos amigos na escola,
nas festas, nas brincadeiras, no ambiente
escolar interferindo na dinâmica de sala de
aula, no relacionamento familiar causando
transtornos domésticos às refeições ou na
hora de assistir televisão, entre outros.
Sendo desvalorizado, excluído, com
sucessivas histórias de fracassos, vai haver
um comprometimento no seu comportamento
emocional, social e até corporal, com
probabilidade de desenvolver baixa
autoestima, sentimentos de inferioridade e
de culpa, ansiedade, inibição, depressão,
distúrbio de coordenação motora,
incapacidade de se controlar, entre outros
problemas decorrentes deste seu
comportamento.
A Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers é um método de intervenção
psicoterapêutica que busca a compreensão do
sujeito psíquico mediante a integração dos
seus aspectos emocional, corporal e social,
tendo como eixo central de atuação o corpo
que é por onde todo ser humano realiza o seu
processo de aprendizagem e construção do
Ser.
Utilizando-se de
exercícios de psicomotricidade diferenciada,
trabalho corporal e verbalização, estas
vivências vão possibilitar o desenvolvimento
da atenção, do processo criativo, dos
pré-requisitos necessários à aprendizagem,
da busca da autonomia e outros aspectos,
propondo-se ao desenvolvimento integral do
Ser.
O problema básico da
criança hiperativa não é o de prestar
atenção, mas sim o de manter a atenção
focalizada e por períodos mais longos,
principalmente em tarefas que lhes pareçam
menos interessantes. A base do trabalho
corporal em Ramain-Thiers é a busca de um
estado de “atenção interiorizada”. Simone
Ramain definia a atenção interiorizada como
“um estado de energia desconhecida,
difusa no organismo e que através das suas
propostas o indivíduo descobre em si,
descobre como usá-la, quando necessário se
faz um estado de atenção. ”A proposta do
Ramain-Thiers não é o de viver
permanentemente em estado de atenção, porque
isto tira a espontaneidade da ação, mas
fazer uso da sua própria energia interior em
situações diferentes. É perceber-se na ação,
perceber o mundo, buscar o equilíbrio e
também poder aprender a estimulação da
percepção corporal, às quais tem o objetivo
de promover uma maior integração do sujeito.
Nesta atividade, materiais como bolas de
diferentes tipos e tamanhos, bambolês, sacos
de areia, tecidos, algodão, esponjas, cordas,
fitas, elásticos são utilizados como objetos
mediadores e facilitadores do contato entre
o sujeito e o seu próprio corpo. As
propostas corporais procuram, sempre,
despertar a capacidade de cada um acompanhar
o seu próprio movimento interno para
descobrir o sentir nação, interligando o
orgânico ao sensível.
O movimento corporal, pela
experiência vivida, leva à ação consciente,
porque a experiência favorece a relação, e a
relação consigo alarga a percepção de si e
do outro, alarga as possibilidades de
insigths. Em Ramain-Thiers não existe a
repetição, mas sim situações de experiências
onde a criança ou adolescente são capazes de
buscar na vivência anterior recursos que,
dinamizados, podem ajuda-los a ter
insights. As atividades de
psicomotricidade Diferenciada são várias e
envolvem dobraduras, cópias, trabalhos com
arame, quebra-cabeças, texturas, recortes,
atividades artísticas, representações de
símbolos, utilizando material específico
como papéis quadriculados, triangulados e
pontilhados, pranchas de diversos tipos,
material plástico como papéis de diferentes
tipos (papel espelho, laminado, camurça,
etc.), tinta guache, cola colorida, tesoura,
pincéis, lápis de cor, giz de cera, argila,
tecidos, etc. Também utiliza-se sucatas. A
criança hiperativa sofre de uma grande
desestimulação diante dos seus fracassos,
manifestando conflitos internos,
caracterizados pela ansiedade e até
depressão. Não refletindo para responder,
muitas vezes comete erros, sendo chamada de
“burra” pelos colegas e até pelos pais e
professores.
Na Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers a troca dos lápis (preto,
vermelho, azul e verde), o uso da cola e o
durex resgatam o poder de reparação que na
vida nos é exigido fazer. As propostas
psicomotoras permitem ao hiperativo
vivenciar seus erros e acertos, ver o lugar
em que ocorreram, visualizar as razões que
contribuíram para que acontecesse, levando-o
ao seu autoconhecimento. É permitido errar
sem cobranças e com possibilidade de
resgatar suas questões internas e aprender
como lidar com falhas, sem, no entanto,
carregar nenhum estigma de incompetência.
Uma das manifestações da hiperatividade é a
falta de controle e impulsividade,
observando-se uma tendência à satisfação
imediata de seus desejos e pouca tolerância
à frustração. Uma das vantagens do trabalho
em grupo do Ramain-Thiers é a questão dos
limites. As instruções de orientação para
execução das propostas das atividades de
Psicomotricidade Diferenciada são,
geralmente, pronunciadas uma só vez para o
grupo. Quando há necessidade de se repetir a
instrução, isto é feito juntamente com o
grupo, numa tentativa de resgate ou de
reconstrução da mesma. A proposta é a Lei em
Ramain-Thiers. Não pode ser dissimulada nem
transgredida, porque representa
simbolicamente a entrada do sujeito na
cultura. É exatamente o que permite ao
indivíduo viver em sociedade, respeitando a
si e ao outro, convivendo com os limites
internos e externos. Pelo seu quadro
apresentado, inicialmente a criança com
diagnóstico de hiperatividade é trabalhada
individualmente. Quando apresenta condições
para tal é inserida no grupo, onde entre
outras vantagens pode perceber que os outros
também têm dificuldades, dar-se conta das
suas potencialidades, perceber o outro e
aprender a respeitar o outro bem como
colocar limites.
Uma criança dentro do
grupo pode repetir através das relações que
estabelece com os outros componentes, o
mesmo modo, a mesma atitude com a qual é ou
foi tratada em sua família, assim como pode
também atuar contrariamente a esta
experiência. Situações traumáticas vividas
dentro do grupo familiar podem vir a ser
representadas espontaneamente dentro do
grupo e assim grandes ou pequenas
dificuldades podem vir a ser resolvidas
através da experimentação de novas atitudes.
Umoutro momento da sessão em Ramain-Thiers é
a Verbalização, na qual o grupo, através de
cada um dos seus componentes, fala
livremente a respeito do que vivenciou e
executou.
Assim, a
Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers, através
do uso de materiais e técnicas aparentemente
simples, como o recortar, colar, a troca de
lápis, o olhar, o andar, o balancear-se com
bolas, tecidos, fios e verbalização, permite
ao sujeito entrar em contato com o seu
interior, descobrindo-se, dando-lhe maior
conhecimento de si mesmo no lidar com o
outro e o mundo. Tendo uma visão
globalizante, a técnica Ramain-Thiers é
eficaz no tratamento de criança hiperativa,
pois não atinge apenas o seu comportamento,
como acontece quando apenas se utiliza de
medicamentos. Não basta acalmar o
comportamento agitado, de causas internas ou
externas, pois assim cessam outras formas de
analisar o comportamento. Tendo como
objetivo trabalhar o sujeito como um todo,
visando criar um maior campo de
desenvolvimento individual e grupal, a
Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers pode
ocupar um espaço inovador e eficaz no
tratamento da hiperatividade.
REFERÊNCIAS
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de Atenção/Hiperatividade. São Paulo:
Casa do Psicólogo, 2000.
LOBO, A. L. M.: Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers – Uma Nova Possibilidade
de Desenvolvimento Pessoal. Psicopedagogia
on line:
www.uol.com.br/psicopedagogia,
2000.
RHODE, L. A. P.; BENCZIK, E. B. P.:
Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade:
O que é? Como ajudar? Porto Alegre: Editora
Artes Médicas Sul Ltda., 1999.
THIERS, E.: (ORG.) Compartilhar em
Terapia: seleções em Ramain-Thiers. São
Paulo: Casa do Psicólogo, 1998.
THIERS, S.: Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers: uma leitura emocional,
corporal e social. 2. ed. Casa do Psicólogo,
1998.
TOPCZEWSKI, A.: Hiperatividade, Como
lidar? São Paulo: Casa do Psicólogo,
1999.
THIERS, S. THIERS, E.: (ORG.)
A Essência dos Vínculos.
Rio de Janeiro: Altos da Glória, 2001. P.
348.
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