Na gestação teve
problemas e ele nasceu em 30/09/89, na
maternidade, de parto normal. Andou com nove
meses e só falou aos quatro anos por causa
da fenda palatina, aos seis anos chupava
chupeta, tomava mamadeira e era amamentado
ao peito. Sono muito agitado e só foi
separado do quarto dos pais depois de grande
(não disse a idade) e lembrou que até hoje
ela ainda acorda várias vezes a noite para
vê-lo. Disse que ele urinou na cama até os
cinco anos. Com oito anos caiu de uma laje
de quatro metros e quebrou o maxilar. Entrou
na escola com sete anos, mas teve muita
dificuldade de se adaptar, foi muito
rejeitado por causa da fala e que até hoje
suas amizades são pessoas mais velhas. Não
mora com o pai e reclama muito a ausência
deste e com os irmãos tem um relacionamento
normal, com brincadeiras e brigas. O sistema
de educação e correção usado pela mãe é ter
muito diálogo e se precisar castiga tirando
o que gosta, “castigo só em caso muito sério”.
Disse ainda que ele gosta de música e de
esporte. Da alimentação, falou que por causa
da fenda palatina ele comia muita coisa
pastosa e que aos poucos foi sendo
introduzida a alimentação normal e que hoje
ele se alimenta normalmente. Ele não sai de
casa sozinho e sem permissão. Afirmou que o
filho não tinha curiosidade sexual.
Venâncio
É o caçula de um casal
de irmãos. Os pais são casados. A mãe
reclamou que o filho tinha muita dificuldade
em aprender. A sua gestação foi problemática,
passavam mês em casa e outro no hospital e
que ele nasceu em 19/07/89 de cesariana.
Andou com um ano, falou com dois anos, usou
chupeta, mamadeira e foi amamentado ao peito
até os três anos. Tem sono calmo e foi
retirado de perto dos pais com cinco anos,
mas sempre dormiu com os pais. Controlou os
esfíncteres por volta dos dois anos. Única
doença quando pequeno foi pneumonia, uma vez.
Tem bom relacionamento com os pais e quase
não tem amizades seja na rua ou na escola,
que ele gosta de brincar quando vai a casa
de uma tia nos feriados. A mãe não gosta que
ele saia e a forma de correção é o diálogo e
se necessário tira-lhe o que gosta. Mora
numa pequena casa de tábua com um quarto,
uma cozinha e um banheiro. Falou que a
alimentação dele é ótima. Lembrou que foi
muito difícil deixá-lo na creche com seis
meses, os dois ficavam chorando e que ele
demorou muito a se alfabetizar. Disse que
ele não tem curiosidade sexual e que na
família não conversam sobre “isso”.
Laila
Foi muito difícil
conversar com alguém da família de Laila. Um
dia o pai veio a escola, com muita pressa,
dizendo que não podia demorar. Nessa curta
conversa consegui a autorização dele para
que ela participasse do grupo.
Ela foi encaminhada
por apresentar grande agressividade,
dificuldade de relacionamento com professor
e aluno. A preocupação é com seu futuro, já
que a escola sabia que suas irmãs mais
velhas já haviam deixado a casa dos pais,
uma estava morando com um marginal e que a
outra estava na prostituição (a idade delas
é de 14 e 16 anos respectivamente). A mãe
alcoólica, quando nesse estado espanca Laila,
se o pai toma conhecimento sai batendo na
mãe e assim vira um círculo vicioso de
violência. Ela é a caçula de três irmãs.
RELATO DA EXPERIÊNCIA
Iniciei a primeira
sessão da Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers, com Washington e Katrine
conversando sobre o contrato, que são as
regras seguidas: sigilo, presença, retirando
dúvidas sobre a metodologia e apresentando o
trabalho que seria realizado, ou seja,
apresentando a verbalização, que seriam os
momentos de conversa entre todos do grupo; o
trabalho corporal, que seria o momento de
movimentos corporais e a psicomotricidade
diferenciada, que seriam propostas escritas.
Logo após a conversa
foi iniciado o processo terapêutico.
Apresentei o Trabalho
Corporal, que foi feito com ênfase no
reconhecimento do corpo e a posição no
espaço. Mexendo braços, mãos, pernas, pé,
pescoço, eixo central, direita/ esquerda,
frente/costas.
Verbalizaram que foi
bom.
Observei que não
apresentavam praticamente nenhum
conhecimento do seu corpo. Tinham muita
dificuldade para se mexer, para atender ao
que era pedido, manter o equilíbrio, enfim,
mostraram-se estranhos ao seu próprio corpo.
Isso me fez pensar no que foi bom para eles?
Pensei na possibilidade que eu estava dando
a esses sujeitos de conhecerem o seu próprio
corpo e de se conhecerem.
Como proposta
diferenciada foi pedido um desenho livre e
eles ficaram muito concentrados. Quando
acabaram conversamos sobre os desenhos.
Washington falou que
havia feito o desenho do campo de futebol
pensando muito em seu pai e que ele sempre
ia ao campo com seu pai quando era pequeno.
Gosta de futebol pois é uma arte, depois
comentou sobre sua vida com a mãe. Já
Katrine falou muito do seu desenho,
comparando-o com o local onde mora. Seu
desenho era um ambiente perfeito e sua casa
(onde mora) não tinha muita coisa dela
naquele desenho. O tempo todo falou do pai.
Katrine falou muito do
pai e Washington se referiu a mãe, pois o
grupo é lugar de projeção de fantasmas e
nesse momento estavam projetando seus
fantasmas, na cena criada por eles. Eles
surgem de uma forma mais contida no início
do grupo, mas depois são revividos e
liberados através de projeções e assim vão
refazendo e reconstituindo as imagos.D.
Anzieu, 1986,declara:
[...] “que o fantasma possui
uma organização grupal interna”. Isto
explica claramente porque o indivíduo busca
e encontra em qualquer tipo de grupo formal
os personagens que podem desempenhar, a
nível de realidade, o papel desejado por ele,
a fim de corroborar o desejo ou os temores
contidos em seus fantasmas. O Indivíduo
prosseguirá com essa mesma busca no grupo
não diretivo e terapêutico, com a única
diferença de que, neste caso, como em
qualquer situação analítica, a projeção
desempenhará um papel muito mais importante.
(DECHERF, 1986, p. 91).
Nesse caso,Katrine trazia
à tona seus fantasmas referentes a imago
paterna(lei) eWashington a imago
materna(desejo).
Como é o início do
trabalho grupal, eles apresentam o interesse
claro por rever e reviver seus temores e
desejos.
A Segunda proposta foi
recortar de revistas,as figuras que gosta e
colar em meia folha de papel Kraft.
A princípio Washington
falou que não gostava de nada, mas pegou as
revistas e começou logo a recortar. Katrine
desde o início deixou claro suas
preferências: artistas, bichos de pelúcia,
comida e outros.
Os dois enquanto
recortavam falavam de suas vidas.
Ele: de sua vivência com
a avó em Belo Horizonte e de seus primos.
Ela: com seu convívio com
seu pai em casa. Não mencionou muito a mãe,
somente quando falou que a mãe iria levá-la
ao médico para saber o que era uma dor de
garganta que aparecia toda vez que ela
chegava em casa. Perguntada se ali aparecia
a dor (naquele momento) ela disse que não e
nem quando está na escola.
Os desenhos livres me
serviriam para avaliar em qual fase do
desenvolvimento psicossexual eles se
encontravam. No fim da sessão ao avaliar
cheguei a conclusão que era a fálica.
Só que no mesmo dia
apliquei uma proposta da fase genital. Isso
só me foi mostrado em supervisão, não havia
percebido tal fato. É assim que se percebe o
quanto enxergamos e ouvimos o que queremos,
pode ser erro de principiante, mas nesse
caso, foi evidentemente o não querer
enxergar devido ao narcisismo: ”Agora sou
terapeuta, não erro”.
Na sessão seguinte foi
apresentado um novo integrante ao grupo,
Venâncio, ficou sabendo das regras e sigilo
da terapia.
Como já haviam iniciado
anteriormente a proposta, Venâncio ficou
sabendo o que era para fazer e de imediato
começou o seu. Ficaram muito calados e
quando Katrine falava se referia a outras
pessoas e não a si ou a coisas que lhe dizem
respeito.
A falação de Katrine
demonstrou um mecanismo de defesa para não
entrar em contato com o que estava
apresentando no trabalho que fazia, pois
deixava claro o conflito entre sua procura
por uma identidade adulta e o medo de perder
a vida infantil, desejo pela criança que não
queria perder, demonstrado através de
recortes de bonecas, brinquedos, maquiagem,
fotos de modelos, fotos de artistas famosos.
Esses medos são normais
na adolescência, já que a adolescência é uma
etapa de buscas constantes, segundo Marcelli
e Braconnier, 1989, p. 196: “o despertar e
remanejamento das posições infantis,
associados à emergência de novos
investimentos”, onde o indivíduo busca
estabelecer sua identidade, que o fará fazer
escolhas e sofrer perdas, se apoiando na
relação parental e sua convivência com a
sociedade. Nessa construção o indivíduo
passa por conflitos e lutos. Os lutosse
vinculam à perda do corpo infantil, do seu
espaço como criança, perda da dependência
dos pais e da convivência com sua “ vida
adulta”, modificações no corpo, a tomada de
atitude buscando uma identidade.
São essesos conflitos
mostrados por Katrine quando cola figuras de
bonecas e de modelos famosas? Ela está entre
a criança e o adulto, está buscando saber:
“Quem sou? ”. Penso que a sua dificuldade
confirma esta possibilidade.
Terminaram o trabalho com
recortes aparecendo um pouco de cumplicidade
entre Katrine e Venâncio, o diálogo foi
aparecendo, mesmo sendo pequenos e rápidos.
Em outro dia, a sessão
ficou restrita ao trabalho
corporal.Aconteceu que ao preparar o
material da sessão eu “esqueci” o papel
quadriculado que precisaria usar, não sendo
possível fazer a proposta diferenciada.
Resolvi iniciar a sessão
com o trabalho corporal sem saber ao certo o
que fazer a seguir.Pedi para caminhar pela
sala com respiração profunda no ritmo da
música (lenta).Ao passar pela mesa pegar um
pedaço de papel celofane. Olhar através do
papel todas as coisas, mesa, cadeira, o
outro, o teto. Continuar caminhando e ao
passar pela mesa pegar outra cor de papel e
fazer a mesma coisa que havia feito com a
cor anterior.Após, com as duas cores de
papel na mão trocar um com o outro e também
observar. Parar em frente ao outro e juntos
criar um objetocom os papéis.
Foi aí que Venâncio e
Katrine pararam e não conseguiram continuar,
mesmo eu dizendo que podia amassar,
modificar o papel, juntar. Após uns minutos
resolveram usar a mesa e entãocomeçaram a
criar um cenário: um mar com peixes. Para
isso rasgaram os papéis e pediram durex.
Conseguiram fazer após um longo tempo (não
sei se para eles ou se para mim). Foi feita
a finalização do trabalho corporal com a
despedida do produto e partimos para a
verbalização. Falaram que fizeram o mar
porque o mar significa liberdade e eles
gostam dela. Pouco falaram e eu pouco
questionei. Terminei a sessão com a sensação
de estar voando cega em meio a nuvens.
Segundo Marcos Berstein,
1986, Pichon-Rivière, declara que:
“Todoo processo de cura implica mudança”. A
atitude diante da mudança pode ser positiva
e falamos, então, de atitude mutante; ou
negativa, à qual chamamos de resistência à
mudança. Frente às situações de mudança,
surgem os medos básicos: o medo da perda e o
medo do ataque. O primeiro é o medo de
perder o que já se tem (por exemplo: marcos
referenciais prévios, benefícios secundários
do sintoma, adaptações passivas à situação
de enfermidade, etc.). O segundo é o temor
frente ao desconhecido, que pode ser
perigoso, e diante do qual sentimos que não
estamos instrumentados para manejar com a
situação.
(OSORIO, 1986, p.109.).
No processo terapêutico
procura-se a diminuição dos medos básicos,
pois eles “paralisam o eu e o tornam
impotente”. No grupo será fortalecido o eu e
sua adaptação à realidade.
O que havia até aqui era
um total envolvimento entre terapeuta e
grupo, sem definição de papéis (quem é o
terapeuta?).
Essa sessão mostrou que
eu necessitava de estudo e de confiança no
que fazia. O planejamento, a atenção, a
escrita do relato do acontecido no dia da
sessão, a preparação de outras propostas
para não ser surpreendida por mim mesma.
Foi um período de muito
aprendizado e de questionamento para mim,
foi a partir daí que me propus realmente a
definir papéis, ter atenção interiorizada e
aprender a ser terapeuta.
Em outro dia, aconteceu o
primeiro encontro de Laila, passei as regras,
Katrine demonstrava muita alegria em ter
mais alguém no grupo. A proposta foi uma
semi-diretiva que seria construir uma
escultura diferente de pessoa com isopor e
estilete.
Elas dividiram o isopor
em partes iguais e começaram a fazer. As
duas decidiram fazer uma árvore, mas quem
primeiro começou foi Laila. Mostrou-se muito
decidida, sem medos, sabendo o que fazer.
A Katrine mostrou-se
muito insegura, fazendo e refazendo. Sabia o
que fazer,mas não achava que estava bom.
Ao final, Laila falou que
fez uma árvore em homenagem a natureza e que
lembrava de sua casa. Katrine também lembrou
de sua casa e do quintal.
Laila me provocava muita
antipatia e foi nesse encontro que percebi a
contratransferência e aindaa causa. Ela
representava o meu espelho, tinha atitudes
na escola que eu negava em mim e a antipatia
era uma atuação. Ao mesmo tempo ela era uma
pessoa que reivindica o que quer, o que me
provocava inveja e por isso menosprezava,
para anulá-la e continuar no meu mundo
perfeito onde reinava e ninguém atrapalhava.
Para entender o que é contratransferência, é
preciso saber o que é transferência.
Segundo Roberto
Bittencourt Martins 1986, transferência para
Freud:
[...] “sãonovas edições de impulsos e
fantasias do passado que surgem no curso da
análise” e “substituem uma pessoa anterior
pela pessoa do médico” ... e, ainda, ...”uma
série completa de experiências psicológicas
são revividas não como pertencentes ao
passado, mas aplicadas no momento presente
ao terapeuta”. (OSORIO, 1986, p. 54.).
Portanto é num setting
terapêutico individual e ou grupal, que a
transferência de sentimentos e imagens
infantis guardados ressurgem e são
direcionados para o terapeuta ou para
qualquer outro elemento do grupo. Quando
isso acontece com o terapeuta, ou seja,
existe uma resposta de sentimento e ou uma
reação do mesmo diante da transferência,
ocorre a contratransferência. Dessa forma,
entendendo o que ocorria, pude conviver
melhor com a Laila.
Passando os dias percebi
que a relação deles com o corpo estava
melhor. Assim preparei um trabalho corporal
onde a ênfase foi dada ao tato. Trabalho com
tecidos com texturas diferentes. Escolher um
tecido e brincar, passar pelo braço, rosto,
pernas. Agrupar dois a dois, trocar os
tecidos e experimentar. Reunir em grupo e
cada um vai fazer um gesto com o tecido em
que os outros possam repetir. Despedir dos
tecidos deixando-os na mesa.
Neste trabalho corporal,
quis enfatizar o contato com o corpo, esse
corpo que no adolescente está se modificando
rapidamente: no biológico, no físico e no
emocional. Ao se tocar, abre-se uma “janela”
para que: possa extravasar as emoções, que
essas modificações fazem aparecer; dê
condições de viver os lutos; comece a
aceitar a perda do corpo infantil e o início
do corpo adulto;enfrentea saída do grupo
familiar, para ser ele mesmo e procurar
construir uma identidade própria. Ao brincar
com os tecidos é despertada a sensibilidade
e o contato com o outro, na troca de
atividades ou repetição de gestos, onde a
tentativa é de facilitar o inter-relacionamento
dos elementos do grupo.
Na proposta diferenciada:
AD 01/04, todos fizeram, mas pouco
verbalizaram.
Washington reclamou o
tempo todo, falando que o dele estava errado,
feio. Quando o questionado, porque ele disse
que estava feio, responde: porque estava, ou
porque sim ou não respondia.
Venâncio fez a cópia de
uma forma bem diferente, então perguntei
porque você preferiu fazer assim, ele falou
porque quis. Perguntei se havia diferença
entre o modelo e o que ele fez, ele falou
que havia e que queria que ficasse assim.
Laila demonstrou que não
gostou de errar, teve muitas dificuldades
com a trocas de lápis de cor e na hora de
montar.
Katrine teve muita
dificuldade em contar os pontos e de fazer a
cópia antes do recorte.
Todos demonstraram defesa
e atenção. Cada um buscou a aprovação da
terapeuta de uma forma: reclamando, se
fazendo de displicente, com insegurança ou
se achando o máximo.
No Trabalho Corporal:
ênfase na respiração, eixo central e
lateralidade, buscaram seguir a proposta sem
muito interesse.
Na proposta livre onde
foi pedido para fazer uma flor com papel de
doces e fio para flor.Foi dado cinco papéis
brancos para cada um e mais cinco papéis de
outra cor (eles escolheram o prateado entre
outras cores).
Washington de início nem
escolheu, pegou a mesma cor que Katrine.
Estimaram o tamanho dofio, mas não sabiam
como fazer. Washington iniciou e Katrine
começou a copiá-lo, na medida que o tempo
passava ela foi se soltando e fez uma flor
bem diferente.
Washington reclamou muito
e sempre falava que o dele estava feio,
questionado porque dizia isso, ele respondia
que não sabia. Num dado momento, ele falou
que nem a mãe dele ia achar bonito. Então
perguntei se a mãe dele sempre achava as
coisas que ele fazia feio e ele respondeu
que não e ficou quieto.Daí a pouco ele falou
que estava com fome e que não havia tomado
café da manhã, pois havia acordado mais
tarde e seus irmãos tinha comido tudo.
Perguntei se ele fala com os irmãos sobre
isso e ele disse que não adiantava nada.
Katrine falou do feriado,
dos professores e que achava uma das
professoras uma “mãe” e que era uma pena que
mãe só tinha uma. Aí Washington falou que
não concordava, que nós temos várias mães e
em vários locais, quer dizer, tem gente boa
em todos os locais.
Porque lembraram da mãe?
A mãe é quem gera o filho,
o alimenta e dela vem a família. É isso que
todo adolescentebusca e repara quando tem a
oportunidade de trabalhar em terapia. O queo
indivíduo busca e quer é uma família com boa
convivência, que o sustente para sua vida
futura.
A imago materna leva ao
desejo, o desejo de gerar, de criar, de
descobrir. Desta forma lembraram da mãe e em
sua criação surgiram flores bonitas. Eles
realizaram aquilo que pretendiam, pois
tinham desejo de fazê-lo.
Todo mundo busca o colo e a aprovação de mãe.
A transferência para o
terapeuta, representava nesse caso a “mãe” a
quem eles buscavam aprovação e o carinho.
Por isso Washington reclamava, queria
atenção e Katrine só consegue fazer quando
incentivada. Dando o suporte necessário eles
criaram e se realizaram na proposta.
Na proposta AD 14/04, o
entrelaçamento com dois fios de cores
diferentes, onde eles escolheram as cores de
sua preferência.Começaram com um pouco de
dificuldades de seguir o modelo e localizar
o ponto A no tabuleiro. Durante todo o
momento foi necessário dar sustentação aos
três, pois houve muita brincadeira entre
Katrine e Washington. Apresentaram uma
dificuldade em comum que foi rodar o
tabuleiro conforme o entrelaçamento ia
acontecendo. Pontuei essa dificuldade e
associei a alguma dificuldade da vida. Se
você encara o problema com um ponto de vista
definido sem ficar complicando, ou seja,
virando é mais fácil resolvê-lo. Os três
conseguiram fazer e com o segundo fio foi
mais fácil e mais rápido.
O entrelaçamento foi
escolhido para trabalhar a organização
visual e o relacionamento no grupo. O
entrelaçamento leva o adolescente a ver o
outro, se espelha, jogando para o outro a
figura parental. É possível que por isso
surgiu a brincadeira, os risos, para fugir
desse contato. O primeiro contato foi mais
difícil, a primeira linha, se negando até a
começar, pois não enxergavam o ponto A. Com
o primeiro contato feito, a continuação foi
mais fácil. Asegunda linha foi agradável,
depois do impacto do primeiro contato, das
atuações na vida, das transferências vividas
nas sessões aceitar outro fica um pouco mais
fácil.
No período de festas
juninas foi dada a instrução que era para
eles construírem uma maquete de uma festa
junina contendo os seguintes elementos:
barraquinha, pau de sebo, fogueira e pessoas.
O que quisesse acrescentar poderia.
A base era um isopor e
material bem variado: barbante, massa de
modelar, papel de seda, palitos variados
eoutros materiais.
A confecção começou com
Washington fazendo a fogueira e com a total
liderança de Katrine sobre o mesmo, dizendo
o que queria e como queria. De repente ele
cansou de obedecê-la e foi fazer as
bandeirinhas. Ela ficou na fogueira. A
partir daí instalou-se a disputa pela
liderança, como também, pela minha
preferência. Disse a eles por várias vezes
que o grupo eram eles e que tinham que
decidir juntos.
Ficou pronto uma
barraquinha, a fogueira e um lado de
bandeirinhas.
No encontro seguinte já
iniciaram pegando os materiais para
continuar a festa junina. Washington falou
que tinha que cercar a festa e foi logo
pegando o barbante e fechou todo o local da
festa. Quando perguntado: como as pessoas
iam entrar? Ele responde: que iam passar por
debaixo. Pergunto ainda, se a vida dele
havia muita coisa que ele não podia fazer,
ou se ele cumpria muitas normas, mas ele
nada disse e continuou. Começou a colar
bandeirinhas na cerca e fez uma barraquinha
do lado de fora do cercado. Katrine
perguntou para que aquilo e ele falou que
era a bilheteria ou um local onde os
dançarinos poderiam trocar de roupa antes de
dançar. Os dois fizeram várias bandeirinhas
juntos e o tempo todo foi de implicância de
um com o outro.
Em outra sessão, pegaram
o material e falaram com Venâncio o que
estavam fazendo. Katrine logo o tomou como
ajudante, mas toda vez que ele ia ajudar ela
desfazia do resultado dizendo que não era
aquilo queria, e ele sempre aceitava calado.
Certa hora pontuei, dizendo a Katrine se ela
costumava tratar as pessoas daquela forma,
ou seja, chamar as pessoas para perto e
depois desfazer de tudo e de todos, como
estava fazendo com o Venâncio. Perguntei se
ele ia ficar sem reagir, se ia ficar
aguentando calado aquela situação, mas ele
não falou nada. Aí, em silêncio foi ajudar
Washington que lhe havia chamado. Juntos
fizeram o pau-de-sebo com um saco de
dinheiro fincado no alto e fizeram os
dançarinos. Acabaram os três fazendo os
banheiros e o chão com as pontas de lápis.
Finalizaram, limparam e
organizaram.Então pedi que escolhessem: quem
gostaria de receber o trabalho e ou, quem
gostaria de dar o trabalho. Washington logo
falou que gostaria de ficar com
trabalho,pois gosta de levar para casa
aquilo que faz. Venâncio falou que dava para
Washington por causa do seu empenho. Katrine
falou que dava para Venâncio por ele ter
participado naquele dia. Perguntados como se
sentiam vendo o resultado dos trabalhos?
Responderam que sentiam bem e capazes.
Katrine perguntou se podia voltar atrás,
porque gostaria de dar o trabalho para
Washington, pois ele implica muito e brinca
demais, mas o seu trabalho aparece.Pedi para
que levasse para casa, mas os três me
pediram para mostrar a Diretora da Escola.
Eu falei que podia.
A diretora havia saído
naquele momento, então mostraram as
pedagogas e deixaram lá para mostrar a ela.
Depois de alguns dias,
foi mostrado a diretora e levado para casa,
sem precisar lembrá-los.
G. Decherf, 1986, p. 123,
afirma que: “tudo que a crianças fazem ou
dizem no grupo tem um sentido, quer se trate
de atitudes, produções, demandas afetivas,
provocações eventuais, etc...”.
Muito gratificante
observar o empenho desses meninos e
verificar que começavam a se valorizar
mostrando o seu trabalho.
Nessas sessões ficou
claro a disputa pela liderança no grupo.
Decherf,1986, ainda
afirma que para Freud existem vários tipos
de grupo, sendo que o primeiro deles é a
família. O adolescente tem uma tendência
grupal, pois é no grupo que ele adquire
forças para a transição da saída da família
e entrar na sociedade com uma personalidade
adulta.
No grupo sempre aparece a
figura deautoridade, sendo essaautoridade o
ideal do grupo. Os líderes assumem vários
papéis, segundo G. Decherf, 1986, podendo
ser: Megalomaníacos,Edipianos e Heróis. O
seu aparecimento é um mecanismo de defesa
contra a angústia. Ao se destacar como líder,
os outros ficam submissos ao seu poder.
Quando o grupo se cansa ou não o quer mais o
líder o destituem elegendo outra liderança
em seu lugar.
Nessas sessões houve uma
luta muito grande pela liderança entre
Katrine e Washington sendo esse o escolhido
para ocupar o lugar de líder edipiano devido
seu domínio e sedução.
Em outra sessão iniciei
com o trabalho corporal.
Foi pedido para entrar em
contato com a música, caminhando lentamente
pela sala, respirando fundo e quando achar
um local que lhe agrade, parar.Com as mãos
unidas esticarem bem o corpo. Tentar ocupar
o menor espaço possível. Nesta posição, se
abraçar, se acarinhar nos braços, nas pernas,
na barriga, no cabelo, etc. Depois aos
poucos sair dessa situação de menor espaço,
s sentando, esticando as pernas, os braços e
se levantando. Tentar ocupar o maior espaço
possível se espreguiçando. Caminhar e voltar
aos seus lugares.
Neste trabalho corporal,
no momento em que pedi para ocupar o menor
espaço possível, Katrine não conseguiu e
falou que não sabia, pedi que observasse o
colega, então conseguiu se encolher. Não
verbalizou nada sobre o assunto.
No momento em que pedi
para dar carinho para seu corpo, Washington,
não fez, pulou essa etapa, ficou parado ou
alisava só os seus braços. Também não
verbalizou.Venâncio e Laila disseram que foi
um trabalho agradável.
Na proposta apresentada,
Caleidoscópio AD 08/08, foi proposto colorir
o papel quadriculado de fora para
dentro.Katrine achou muito difícil, ficou
insegura para começar, mas aos poucos foi
fazendo. Não falava muito mas reclamava.
Numa certa hora pediu café e biscoito. Comeu.
Pegou o lápis novamente. Perguntei se
lembrava das regras da proposta. Ela
assegurou que sim.Interpretei que
precisavater mais confiança em si própria.
Ela nada respondeu. Ficou em silêncio e
depois falou que “Dentro vai ser mais
difícil”, perguntei o que havia falado, como
se não tivesse entendido e ela repetiu que a
parte de dentro ia ser muito mais
difícil.Perguntei se começar pelo lado de
fora era mais fácil e me disse que sim.
Perguntei como se muda pelo lado de fora e
ela disse que não sabia e calou-se. Tornei a
perguntar como se muda do lado de fora, após
um tempo e a resposta foi a mesma. Disse-lhe
para pensar em alguém que corta o cabelo,
põe uma roupa nova, o que acontece quando
encontra outras pessoas e ela disse que as
pessoas notam e comentam que está diferente
e com isso percebeu e falou que as pessoas
podem mudar por fora modificando o seu jeito
de vestir, de andar, de falar. Então lhe
perguntei como se muda por dentro e ela
disse que era mudando seus pensamentos,
sentimentos e tornou a ficar calada. Depois
disse que ia completar aquele pedaço,
círculo e ia parar. Queria fazer uma parte
muito difícil, então lhe disse que podia
fazer algo mais fácil. Ela não conseguiu “ver”.
Repeti que haviam partes mais fáceis. Foi aí,
que ela viu os retângulos e disse que ali
era mais fácil. Perguntei se ela não fica
procurando as dificuldades, esquece de ver
as saídas dos problemas e das dificuldades.
Ficou silenciosa. Fez os retângulos e pediu
para ir embora dizendo que continuava na
próxima vez.
Em outro momento,
continuou fazendo, só que agora, com mais
facilidade. Demonstrava estar mais segura do
que fazer. Quando acabou, deixou o centro
vazio dizendo que era um buraco. Questionei
porque? Ela disse que aquele era um buraco e
o desenho de fora era o sol. Então perguntei
quem era o sol? Falou “eu”.E que buraco é
esse? Disse que não sabia interpretei que
pensasse nela, na família e continuou
dizendo que não sabia. Disse que o trabalho
não foi tão prazeroso, mas que gostou de vê-lo
pronto.
Ao propor o Caleidoscópio,
quis mobilizar a escolha, o sentimento de
integração e favorecer a solidão para a
busca de sua identidade e através da
criatividade elaborar o seu processo de luto.
Ao conseguir enxergar
caminhos mais fáceis, escolhendo não o pior,
mas aquilo que pode fazer com mais
facilidade, está buscando um caminho sem
sofrimento e com segurança, com isso, ao
final se vê como um sol. Mas como toda
criatura, ela tem um vazio, que nada mais é
do que a ferida narcísica, que vai movimentá-la
sempre em busca de algo para saciá-la.
Em outra sessão, numa
proposta de atividade livreconstruíram uma
árvore de natale demonstraram muito prazer
em fazer a proposta. Os materiais utilizados
eram variados. A base era pratos
retangulares de isopor, palitos de churrasco
e o restante deveriam criar.
Foi feita em duas sessões
com um resultado muito bom. Haviam presentes,
menino Jesus, estrela, carinho, cuidado e
determinação.
Essa árvore foi exposta
em uma Mostra de Trabalhos Manuais no final
do ano, sendo muito elogiada.
Depois da Mostra, ela
levou para casa e comentou que todos
gostaram.
Katrine mostrou-se muito
criativa, segura, muito diferente daquela
que iniciara a terapia.
Katrine demonstrou grande
crescimento criativo. Em momento algum pediu
ajuda, teve segurança, soube escolher diante
dos materiais disponíveis, planejou o que ia
fazer. Fazendo essa árvore de natal foi
possível notar o seu crescimento e como
evidenciou que diante da vida ela pode criar
e fazer coisas bonitas.
Na proposta de cópia,
diálogo entre os bichos participaram
Washington e Katrine. Cada um escolheu um
bicho, ela o tucano, ele o pinto e fizeram a
cópia. Depois eles escolheram outro animal e
também fizeram a cópia, desta vez foi o
inverso, ela fez um pinto e ele o tucano.
Fizeram em um papel
cartão o cenário e a colagem dos bichos.
Ficou um cenário pobre, onde os dois pintos
estão no chão e os tucanos estão numa árvore
que se parece mais com uma pedra.
Aparece a
transversalidade, pois moram em um morro, de
área pobre, sem muitos recursos naturais e
sociais.
Após a colagem e feitos
os cenários, partiram para fazer o diálogo
entre os bichos. O tema escolhido foi a
vivência em família, após várias propostas
sem definições e com a minha intervenção é
que saiu esta definição. As falas demonstram
grande tristeza.
O Tucano (de Washington):
“A minha família é igual a sua, as pessoas
que tem em minha casa tem muita tristeza. É
difícil ser alegre, eles brigam muito. ”
O Pinto (de Katrine): “A
minha família é quase igual só que quem
briga mais sou eu e minha irmã, mas estou
tentando parar com isso. Faça como eu! ”
Nessa proposta, fica
clara a transversalidade no setting
terapêutico.
Os dois vivem a pressão
das famílias desestruturadas e que na visão
da sociedade estão na margem. Vivem nos
morros em constante contato com todo tipo de
violência. Eles traduzem essa tristeza nas
falas e na decoração do ambiente. A árvore
parece um morro e só tem o chão onde os
pintos estão.
Será que não há mais
nada?
Segundo Luiz Alberto Py
M. Silva, Bion, 1986, descreve:
[...] três suposições básicas:
dependência, luta-fuga e acasalamento.
[...] de dependência, o grupo
se comportacomo se um dos seus membros fosse
capaz tomar a liderança e cuidá-lo
totalmente.
[...] luta-fuga representa a
convicção, frequentemente inconsciente, do
grupo como um todo, de que existe um inimigo
que deve ser combatido ou evitado.
[...] acasalamento que
corresponde à crença coletiva e inconsciente
de que os problemas e necessidades do
grupo,sejam quais forem, serão solucionadas
no futuropor alguém ou algo que ainda não
nasceu. (OSORIO, 1986, p. 58.)
No diálogo dos bichos, o
grupo passou por todos os momentos, quando
escolhiam o bicho, um ficou esperando o
outro (dependência), após juntos definiram o
que iam fazer e partiram para concretizar (luta-fuga),
quando acabaram e escreveram as falas num
clima de tristeza escreveram “eu estou
tentando parar com isso, faça como eu” (acasalamento).
Deixa claro que pode haver mudança, existe
esperança em que as coisas podem ser
modificadas e que através de suas atitudes a
tristeza pode se transformar em alegria.
Em outro momento na
proposta de ampliação de uma tartaruga em
papel quadriculado de dois centímetros. A
escolha da tartaruga foi feita por mim.
Katrine ampliou com muita má vontade,
reclamou dizendo que era difícil. Depois de
feita, falei que era para enfeitar e
apresentei os lápis coloridos, lantejoulas,
purpurina, e outros materiais, mas ela
simplesmente pegou o giz de cera e coloriu
fracamente, colou uma concha no olho e outra
na cabeça como se fosse um chapéu. Perguntei
se era só e ela disse que sim.
Na supervisão seguinte
mostrei e aprendi mais um pouco. Fui
alertada que eu só “pedia” a Katrine, que as
vezes é necessário pulso para ser terapeuta.
O adolescente quer limite e não pode ser só
“pedir”, “sugerir”, as vezes é importante
comandar.
Foi sugerido que
retomasse a ampliação, fazendo recorte,
delineando com linha, e a colocando em um
cenário.
Assim fiz logo na próxima
sessão. Minha postura era que seria feito o
que era proposto e não o que ela “queria”.
Como era de se esperar, com minha postura
íntima mudada o trabalho foi outro. Houve
reclamação ao colocar a linha (a linha nesse
caso significava o limite), mas foi feito.
Recortou e colou no cenário feito em papel
cenário e coloriu muito, usou vários
materiais brilhantes e coloridos.
É importante ressaltar,
que segundo S. Thiers, 1998:
A identidade do
Sociopsicomotricista Thiers é única, porque
ela integra em si, além da sua própria
experiência de vida, a condição de aceitar
trabalhar o indivíduo global:
corpo-mente-afetos-social. Ele não vai
trabalhar só a fala, ou só os dados de
cognição, ou só o inconsciente, ou só o
movimento corporal, mas tudo, despertando um
ser que não sabia que estava adormecido. (THIERS,
1998, p.40.)
E ainda, S. Thiers, 1998
declara que:
O Sociopsicomotricista deve
estar inteiro na relação, sempre espontâneo
na sua forma de ser, interiorizado para
poder perceber que o acontecimento depende
do contexto do grupo e da significância na
singularidade de cada pessoa. A
interiorização mobiliza as energias
corporais ascendentes e descendentes, que
acabam por permitir um fluxo energético mais
intenso. (THIERS, 1998, p.44.).
Aprende-se em todo
momento. Foi esse o meu grande aprendizado.
Ao entender, consegui um bom resultado na
sessão. Eu estava com atenção interiorizada,
ligada ao ser total que estava ali presente
e me propondo a ajudar a crescer. Katrine
reclamou da linha, ou seja, do limite, eu
pude mostrar que era necessário fazer. Que
ao fazer a tartaruga ficar bela, eu estava
ajudando-a a ficar mais bela também.
Na proposta de atividade
livre, o presépio foi oferecido materiais
diversos: bolinhas de madeira furadas ao
meio, areia, prato para planta, palitos de
picolé, papéis de vários tipos, glitter,
cola branca, lantejoulas, miçangas, arame
para flor e pedaços de tecidos. Com o
material fazer um presépio.
Nesse momento apenas
Katrine continuava no grupo, que a princípio
ficou perdida. Disse para que ela fizesse um
planejamento, pensar nos elementos de um
presépio e só depois fazer.
Então ela disse que num
presépio tem: Jesus, Maria, José, animais,
estrela, estábulo. Partiu para o trabalho.
Colocou areia no prato e fez com palito de
picolé uma cerca, tipo meio círculo, apoiado
no prato, e unindo vários palitos apoiados
na cerca, fez o teto. Jogou glitter “para
ficar bonito” disse ela. Esse era o estábulo.
Pegou as bolinhas e foi passando arame entre
elas, unindo-as, montando um boneco, com as
partes do corpo definidas. Fez um cajado com
arame e disse que era José. Colocou-o em pé
e foi fazer outro boneco, que disse ser
Maria, enfeitou-a com pano e falou que era o
manto. Jesus ela fez menor, usando um número
menor de bolinhas, mas com o mesmo princípio.
Fez um cesto de papel e o colocou.
Ficou um tempo admirando.
Perguntei se estava pronto, disse que não.
Está faltando a estrela e o chão está sem
graça só com areia. Então fez uma estrela
com papel e colou glitter amarelo e a pôs
amarrada no teto. No chão jogou lantejoulas
de formato de flor. Quis fazer tudo no mesmo
dia para poder levar logo para casa e
mostrar a todos.Sua realização era total.
A proposta de construção
do presépio, foi feita pela necessidade de
Katrine reestruturar a sua visão de família.
Através de nossas sessões,
foi observado a necessidade de mexer com o
tema família, nada melhor do que no natal,
usar a transversalidade.
O adolescente está
criando a sua identidade, mas é a família a
base para a sua vida. Enxergar a família de
forma saudável, alegre, e de forma afetiva
onde se pode apoiar nos momentos bons ou
maus faz parte do papel como terapeuta.
Houve reflexão sobre o
tema, pois conseguiu fazer, usou a sua
criatividade, planejou, admirou o que fez e
se sentiu realizada.
O brilho que usou mostra
como era seu estado ao concluir. Estava
brilhando. Com esse brilho estava dizendo
que era capaz, que podia resolver seus
problemas, caminhar para o futuro e ir além.
CONCLUSÃO
Ao relatar essa
experiência lembrei da música do grupo “Os
Tribalistas” – Já Sei Namorar, é porque nela
fica claro a vida de um adolescente. As
palavras: sonhar, sair, ganhar, ser feliz é
a verdadeira tradução dessa transição entre
infância e a vida adulta.
O adolescente procura nos
outros um outro que vai lhe completar. Sua
convivência em grupo é para adquirir forças
e as amizades lhe completam e sustentam fora
da família, mas a procura do outro é
necessária para se conhecere entendera
família.
Observei o quanto as
pessoas se querem de formas diferentes e o
quanto lutam para serem felizes. Alguns se
contentam em viver na ilusão por não
suportar a dor da realidade, outros buscam
avançar dentro de seus afetos, de seus
sonhos e de seus desejos.
Ao encerrar esse trabalho
de estágio, pude notar o crescimento do
grupo, sua normalidade dentro da
adolescência, ora criança, ora adulto e a
sua busca diante da vida, o que ser, o que
querer e quem querer.
Por estas questões, é
natural a continuidade da terapia,
encerrando apenas o estágio.
Deixei claro aqui, em
vários pontos, que o meu crescimento foi
imenso, ficando difícil mostrar a sua
dimensão, ou seja, o quanto.
A Sociopsicomotricidade é
verdadeiramente instigante, nos faz estudar,
nosfaz conhecer e investigar nos teóricos,
os porquês das questões.
Esse é um relato pequeno
dentro do tanto que foi vivido. Mas a vida é
assim, nem sempre se pode traduzir para o
papel as emoções reveladas nos encontros de
olhares, ou no sentir da pele e até mesmo no
ouvir do som ou do silêncio.
O Ramain-Thiers me
ensinou muito. Me fez rever e relembrar de
muitas vivenciais da minha vida e de outras
coisas mais.
Encerro com a frase do
livro Duda Mendonça, Casos e Coisas:“Voltei
no tempo. Me vi menino. Pouco a pouco,
comecei a compreender meus medos e porquês
das minhas angústias”.
Complemento com:E me
permiti viver melhor a cada dia.
REFERÊNCIAS
DECHERF, G. Édipo em grupo: psicanálise e
grupos de crianças. Trad. REIS, C. E. Porto
Alegre: Artes Médicas,1986.
MARCELLI, D. e BRACONNIER, A. Manual de
psicopatologia do adolescente. Trad. FILMAN,
A. E. Porto Alegre: Artes Médicas. São
Paulo: Masson, 1989.
OSÓRIO, L. C. Grupoterapia hoje. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1986.
THIERS, S. Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers: uma leitura emocional,
corporal e social. 2ª ed. rev. e atual. São
Paulo: Casa do Psicólogo, 1998. |