A Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers
importa-se com o sujeito social e a
transversalidade, ou seja, trabalha-se “na
relação que os indivíduos mantêm com o
coletivo no qual estão inseridos” (BOCK, p.
176, 2008) desta forma procura-se entender a
dinâmica das relações parentais e sociais,
que se reproduzem nos contatos
psicoterápicos em grupo.
Outeiral, 1998, descreve
diversas experiências de grupos de crianças,
neste olhar pode-se destacar alguns aspectos
que coincidem com o entendimento do trabalho
em grupo realizado pelo método Ramain-Thiers,
como segue:
“No grupo, as possibilidades de diferentes
identificações encorajam mudanças e adquirem
um equilíbrio com seu ego fortificado.
As crianças aprendem novas técnicas para
lidar com seus conflitos, visando a um
melhor domínio da realidade e possibilitando
melhor relacionamento interpessoal. Podem
mais facilmente deixar cair as defesas sem
que, com isto, se sintam desprotegidos. ” (OUTEIRAL,
p. 309, 1998).
Esta riqueza do trabalho em
grupo, comentada por Outeiral, também é
aproveitada por esta metodologia
desenvolvida por Solange Thiers, a
Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers, na qual
os profissionais formados, já desenvolveram
e desenvolvem trabalhos em instituições
públicas e privadas, com os mais diversos
grupos: terceira idade, usuários de drogas,
jovens com problemas psicossociais, de
diferentes culturas, dentre outros, com as
suas particularidades:
“Os grupos de crianças e púberes são muito
questionados em função da agressividade. E
muitos grupoterapeutas de crianças
desistiram deste trabalho em função de
pensar que liberdade de expressão é deixar
fazer o que quiserem no momento do grupo,
sem dar limite. ” (OUTEIRAL, p. 308, 1998)
Para a abordagem psicanalista,
no que compete ao método aqui estudado, a
estruturação da sessão, assim como os
materiais oferecidos são auxiliares, para
promover a organização psíquica das crianças
e também para introduzir os limites, como a
função paterna, que é revivida e resgatada
pelo sujeito no processo psicoterápico. É
fundamental que o estudo do material seja
realizado, para que as ofertas possam ser
adequadas e com isso auxiliar o processo.
“[...] o Método Ramain Thiers é um
instrumento clínico que permite a
visualização e a compreensão de fenômenos
psíquicos do sujeito. Assim como Freud
utilizava-se do divã, Klein dos brinquedos e
Winnicott do espaço, Ramain Thiers utiliza-se
das propostas de atividades psicomotoras
como instrumento facilitador da comunicação
entre o sujeito e seu próprio inconsciente.
” (THIERS, p. 86, 2001).
1. 2 -
ESCOLHAS E ABANDONOS
O interesse aqui é pontuar o que
alguns autores trazem deste processo, pois
no decorrer do estágio psicoterápico do
grupo notou-se que aos poucos o abandono foi
permeando o grupo e como não se conseguiu
trabalhar a “fantasia de desintegração/diluição”
este acabou mesmo por se desintegrar. Talvez
esse tenha sido o aspecto mais constante do
grupo e do qual infelizmente não foi
possível nomear e possivelmente com isso se
inviabilizou sua continuidade.
Se utilizando dos preceitos de
Freud, Ana Freud e M. Klein a autora Raquel
Soifer comenta que os mecanismos de defesa
são à “princípio normais, ou seja, estão a
serviço da saúde” (SOIFER, p 183, 1992), mas
que o normal ou patológico se distinguirá de
acordo com a: oportunidade, intensidade e
consequências de sua utilização. Tal noção é
fundamental para se trabalhar com a saúde
mental, tendo em mente que se trata de um
assunto muito amplo e com diversas
possibilidades de definições.
“Organização Mundial de Saúde diz que o
estado de completo bem-estar físico, mental
e social define o que é saúde, portanto, tal
conceito implica num critério de valores (valorativo),
já que, lida com a ideia de bem-estar e mal-estar”
(PORTAL DE PSIQUIATRIA web site
http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?art=327&sec=31,
consultado em 02/10/2011).
Nesse grupo de trabalho, aqui experimentado,
todas as crianças viviam com a mãe e sem o
pai, dos quatro integrantes apenas uma
mantinha esse convívio, apesar dos pais
serem separados, mas outra vivia a
experiência de separação traumática e
distância da figura paterna e chegaram com a
queixa do sofrimento dessa separação. A
hipótese é de que essa vivência tenha
contribuído com o desfecho do grupo, mas
também que a impossibilidade de trabalhar
esses aspectos se deu no grupo.
As escolhas realizadas pela
condução e vivência do grupo pode ter
falhado no aspecto de buscar ainda mais
essas mães e dar condições das mesmas
acolherem essas crianças, assim como na
terapia fazer uma melhor integração do corpo/
mente.
A Psicomotricidade neste aspecto é uma área
que ganhou espaço no século passado, após
mudanças de paradigmas que durante séculos
procuraram separar corpo e alma, ou soma e
psiquismo, como cita Fonseca (1995). Devido
um novo olhar sobre a importância e
dialética desses elementos, já introduzido
por grandes nomes como Wallon, que Fonseca
cita como “...a pedra angular do edifício da
psicomotricidade...”. O conceito de
psicomotricidade entende corpo e mente não
somente como partes que se completam, mas
sim se constituem mutuamente em
interdependência. A Sociedade Brasileira de
Psicomotricidade traz o seguinte conceito
sobre Psicomotricidade:
Busca conhecer o corpo nas suas relações,
transformando-o num instrumento de ação.
Este corpo pensado como objeto, marcado por
uma mente que pensa. A evolução da
psicomotricidade no homem se dá de forma
natural.
Ela auxilia e capacita melhor o aluno para
uma melhor assimilação das aprendizagens
escolares.
O corpo e o movimento constituem alicerces
para o desenvolvimento da criança. No campo
da Psicomotricidade, a relação, a vivência
corporal e a linguagem simbólica são
imprescindíveis. A psicomotricidade permite
à criança a viver e atuar no seu
desenvolvimento afetivo, motor e cognitivo.
(SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICOMOTRICIDADE,
web site
http://www.psicomotricidade.com.br/
acesso em 27/07/10) grifo meu.
Nesta descrição é possivel perceber o
entendimento não só conceitual, mas também
da possibilidade de intervenção prática da
psicomotricidade no processo de aprendizagem
escolar e também terapeutico.
1. 3 -
CONCLUSÃO:
Pode-se afirmar que a experiência do
abandono é um tema que causa facilmente
algum desconforto e certa dificuldade em
abordá-lo. Pois a vivência de um abandono
pode conduzir o sujeito a re-vivenciar os
diversos abandonos que foram experimentados
na vida.
Nem toda vivência de abandono é patológica,
existem os que fazem parte do processo de
desenvolvimento e amadurecimento, quando
novas escolhas vão deixando para trás velhos
hábitos e funcionamentos que à princípio
podem deixar um vazio, mas que abrem espaços
para novas aquisições, como os traduzidos
nos diversos contos de fadas.
Patologicamente pode ocorrer também do
sujeito se abandonar, por vezes se abandona
um trabalho ainda estando nele, se abandona
relacionamentos, pois pode acontecer de se
deixar de investir no outro por já estar
ocupado mentalmente, seja por fantasia ou
realmente, investindo em outros
relacionamentos. Mesmo o próprio corpo se
deixa de dar atenção, cuidar da saúde,
estética e viver em um corpo abandonado.
Foi em supervisão que ficou evidente que a
história de abandono do grupo, vivenciada em
sua maioria do abandono paterno se repetiu e
facilitou a desintegração do grupo. Este
artigo mesmo esteve por longo tempo
abandonado até que fosse possível processar
todas essas questões e então concluir.
Mas concluir algo também pode ser uma
escolha que nos remete ao sentimento de medo
do abandono, pois uma vez concluída uma
tarefa, novas tarefas surgirão, novos
desafios aparecerão e o medo do desconhecido
pode nos paralisar, podendo estar motivado
por esses medos. E assim não concluímos
leituras de algum livro, não terminamos de
escrever algo, de levar a termo um projeto e
mesmo participar do grupo até sua conclusão
ou alta. O medo da perda se apodera do
sujeito e o impede de realizar os seus
desejos.
Por isso a superação de cada etapa temos que
buscar o amparo, o suporte, ponderando o
binômio: desconstrução e construção;
desestabilizando e estabilizando. Buscando
dar suporte nos processos potencializadores
do psiquismo atendido, mas numa busca de que
o inconsciente não domine o grupo e assim o
desintegre.
REFERÊNCIAS:
BEE, Helen; “A criança em desenvolvimento”.
12º ed. Porto Alegre: ARTMED, 2011.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. DE
L. T. “Psicologias: uma introdução ao
estudo de psicologia” 14º ed. SARAIVA:
São Paulo, 2008.
FONSECA, Vitor; “Manual
de Observação Psicomotora”.
Porto Alegre: Artmed, 1995
FONSECA, Vitor; “Psicomotricidade
Perspectivas multidisciplinares”. Porto
Alegre: Artmed, 2004.
FREUD, Sigmund “Psicologia de grupo e
análise do ego”.Obras Completas: Imago;
Vol. XVIII.
OUTEIRAL, José; “Clínica Psicanalítica de
Crianças e Adolescentes: Desenvolvimento,
Psicopatologia e Tratamento”. Rio de
Janeiro: Revinter, 1998.
SOIFER, Raquel “Psiquiatria Infantil
Operativa”. Trad. José Cláudio de
Almeida Abreu. Porto Alegre: Artes Médicas,
1992.
THIERS, Solange; THIERS, Elaine; org. “A
Essência dos Vínculos”. Rio de Janeiro:
Altos da Glória, 2001.
THIERS, Solange;“Sociopsicomotricidade
Ramain-Thiers: uma leitura emocional,
corporal e social”. 2ª Ed.São Paulo:
Casa do Psicólogo, 1998.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICOMOTRICIDADE,
acesso em 27/07/10 web site
http://www.psicomotricidade.com.br/
.
PORTAL DE PSIQUIATRIA, consultado em
02/10/2011 web site
http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?art=327&sec=31. |