Reflexão
Onde está a minha esperança?
Rubem Alves |
|
Se EU SOUBER ONDE MORA a minha esperança, terei razões para viver
e razões para morrer. E a vida ficará bela mesmo no meio das lutas.
Sei muito bem onde minha esperança não está. Não está nos pobres,
não está nos movimentos populares, não está no povo. Não está também
nas elites, sejam ricos ou doutores, intelectuais ou empresários.
Não está em partido político algum, de direita ou de esquerda. E nem
nos poderes legislativo, executivo ou judiciário. Também não está
nas igrejas e nos movimentos religiosos. Não coloco a minha
esperança em coisa alguma que seja definida por categorias sociais.
Olho para todas elas com profundo desinteresse. Jamais comprometeria
a minha vida com qualquer delas. Onde está minha esperança? Numa
multidão de indivíduos, independentemente do seu lugar social ou
econômico, que vivem possuídos pelo sonho da vida, da beleza e da
bondade. A esperança de Camus estava no mesmo lugar que a minha.
“Já se disse que as grandes idéias vêm ao mundo mansamente, como
pombas. Talvez, então, se ouvirmos com atenção, escutaremos, em meio
ao intrépito de impérios, e nações, um discreto bater de asa, o
suave acordar da vida e da esperança. Alguns dirão que tal esperança
jaz numa nação; outros, num homem. Eu creio, ao contrário, que ela é
despertada, revivificada, alimentada por milhões de indivíduos
solitários, cujos atos e trabalho, diariamente, negam as fronteiras
e as implicações mais cruas da história. Como resultado, brilha por
um breve momento a verdade, sempre ameaçada, de que cada e todo
homem, sobre a base de seus próprios sofrimentos e alegrias,
constrói para todos.”
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem. Pimentas: para provocar um
incêndio, não é preciso fogo. São Paulo: Planeta do Brasil, 2012.
|