Artigo
Ramain-Thiers na
ciranda do relacionamento conjugal
Eleide Lopes Félix |
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Eleide
Lopes Félix
Psicóloga.
Psicoterapeuta. Sociopsicomotricista Ramain-Thiers. Especialista em
Psicodiagnóstico de Rorschach. Terapeuta de Formação em Campo
Grande, MS.
Introdução:
O trabalho de aplicação da Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers na
terapia com casais teve início em 2008, na Clinica Logus, em Campo
Grande, MS. Inicialmente foi realizado na modalidade de trabalho de
grupo, com experimentação de propostas retiradas dos Orientadores
Ramain-Thiers.Resultados positivos advindos dessa experiência deram
início a um novo trabalho que atualmente é oferecido aos casais que
buscam atendimento na clínica.
Geralmente a busca pela psicoterapia conjugal vem pautada na
necessidade de umamelhor compreensão da relação, os casais buscam
uma escuta profissional que façauma leitura isenta dos conflitos que
permeiam os relacionamentos, auxiliando o casal para, a partir
disso, vivenciar o relacionamento de modo mais harmonioso.
Por ser uma metodologia que possibilita o trabalho grupal, onde cada
indivíduo é convidado a uma ação, que é a proposta de
psicomotricidade diferenciada, Ramain-Thiers foi escolhida para ser
utilizada no trabalho. Ao elaborar a proposta, cada indivíduo entra
em contato comas próprias dificuldades, pois essas ficam mais
evidentes, necessitando assumir frente ao grupo seuspróprios limites,
percebendo-se de modo mais consciente, partindo para o aprendizado
de formas de ação mais amadurecidas emocionalmente.
Com o casal acontece da mesma forma, cada um realiza sua parte da
proposta e diante dela, torna-seautor, expectador e colaborador no
trabalho do outro. Observamos situações em que um parceiro tenta
controlar a ação do outro, outras vezes permanece na espera do tempo
do outro. Na proposta de psicomotricidade diferenciada acontece essa
revivência de situações de vida diária, sendo que, aocolocar em
evidência as dificuldades de cada um, possibilita mudanças no modo
de reagir diante das diferenças do outro. Ao viver a proposta
Ramain-Thiers, então, o casal poderá: conhecer, avaliar e modificar
o próprio comportamento aceitando o modo de ser do outro no
relacionamento conjugal.
Assim sendo, demonstrar as possibilidades de aplicação da
metodologia Ramain-Thiers no V Congresso Brasileiro da Metodologia
tem como principal objetivo reafirmar a eficácia da proposta de
psicomotricidade diferenciada como objeto intermediário no processo
psicoterápico, atuando como facilitadora da emergência de conflitos
inconscientes que permeiam os relacionamentos e resultam em
sofrimento emocional dos indivíduos na inter-relação.
Buscamos ainda, neste curso, fornecer um embasamento teórico
referente às diferenças de gênero resultantes de diferenças no
desenvolvimento do psiquismo masculino e feminino, bem como os
conceitos de amor que transitam o imaginário de cada um e aí estão
por força de questões até antropológicas. Este conhecimento é
importante, pois tais fatores influenciam a vida emocional dos
indivíduos que se conjugam.
Sobre o amor e sua história...
Na história da humanidade, tanto as relações amorosas quanto as
grandes histórias de amor têm um lugar de grande importância.
Inicialmente, se algum acontecimento não tivesse uma explicação
lógica (o amor é um desses temas), os mitos eram utilizados como
forma de explicá-lo. Os mitos são de origem grega e romana e
possuem,além de um caráter explicativo, a força simbólicaque
influencia o desenvolvimento do ocidente.
Para falarmos de relação amorosa destacamos três mitos: o de narciso,
o discurso de Aristófanes em O Banquete e o discurso de Sócrates,
também neste diálogo de Platão.
O mito de Narciso ilustra o risco do narcisismo. Todos nós temos um
grau razoável de amor próprio, mas perder a medida deste amor torna
o narcisista incapaz de amar alguém além dele mesmo. O amor do
narcisista acaba nele mesmo, como no mito. O engano de Narciso foi
justamente a escolha errada do seu objeto de amor. Escolheu a si
próprio e morreu nesse amor infrutífero, se perdendo justamente no
momento em que se encontrou.
Em O Banquete, Platão transcreve o discurso de Aristófanes, sobre a
natureza do homem e suas vicissitudes, e sobre a natureza do amor em
si. Neste mito em que as criaturas têm seus corpos divididos em duas
partes, Aristófanes fala da falta que o homem sente da sua outra
metade e da necessidade de se restaurar esta parte perdida.
O último mito relatado no Banquete, o contado por Sócrates, fala
sobre o amor e o seu tão grande poder exercido sobre nós. Sócrates
não reprovava o amor pelo corpo, mas achava que era um tipo de amor
inferior. Segundo ele, o amor ideal e mais belo era o que ligava
deuses e homens. O filósofo, assim, fala deste amor contando a
história de Eros, filho da Pobreza e do Recurso, que vive em busca
do que lhe falta, a beleza.
Os dois primeiros mitos relatados são sobre a busca de uma unidade
perdida, sobre a vontade de ser inteiro mais uma vez. Já Sócrates
narra um mito sobre a busca de um elemento inédito a Eros, algo que
nunca teve e provavelmente nunca terá.
Freud utilizou o mito de Narciso para elaborar um modo particular de
relação do sujeito com a sexualidade. É importante ressaltar que,
aqui, a sexualidade deve ser entendida como qualquer atividade que
dá prazer e que não necessariamente está ligada à sexualidade tal
como o senso comum a concebe.
Na psicanálise, a energia sexual é chamada libido e esta pode ser
narcísica, quando direcionada ao próprio sujeito, ou pode ser
objetal, direcionada ao outro. Ao longo do seu desenvolvimento, o
sujeito passa por diferentes estados narcísicos: no primeiro deles,
o de auto-erotismo, o bebê busca sua satisfação através de um único
órgão sensorial: a boca. No segundo momento, o estado espelho, o
bebê, em torno de 7 meses, ao ser posto na frente do espelho no colo
da sua mãe ou de quem a cuida, se reconhece e se constitui através
do olhar deste outro. O terceiro estado, finalmente, se dá quando o
eu já está constituído e o sujeito passa a investir no outro.
O ser humano passa a vida tentando reencontrar o primeiro objeto de
prazer, numa busca compulsiva de satisfação. A busca do amor
simbólico, segundo os psicanalistas, é uma ilusão.
A escolha amorosa dos homens e mulheres, então, é um dos mecanismos
usados para reviver o prazer de outrora. Tudo a nível inconsciente,
escondido no psiquismo humano. Segundo Freud, o objetivo da escolha
amorosa é voltar a ter a sensação de ser um só, a simbiose total, de
se reconhecer no outro. Tal simbiose é alcançada na paixão, quando
as duas identidades se misturam, a pessoa se vê no outro e essa
fusão pode anular a individualidade. Não há como viver assim. No
casamento não são raras as situações em que os parceiros esperam
viver a paixão indefinidamente.
As crises no casamento ocorrem no momento em que um dos cônjuges se
dá conta de que o outro é diferente de si mesmo, de que o outro não
será capaz de acabar com sua sensação de desamparo, que o outro não
é fonte incessante de satisfação.
Essa descoberta, apesar de ser fonte de dor, poderá promover
crescimento emocional, dependendo do desejo do indivíduo. Após a
crise, nada mais poderá ser como antes...
Deduz-se, assim, que, se o sujeito não cresce emocionalmente,
evoluindo do amor narcísico passando pelo estágio de espelho e
constituindo-se como sujeito capaz de investir no outro,
dificilmente poderá amar de forma recíproca, com um amor feito de
trocas, capaz de suportar as faltas que o outro naturalmente
apresentará no decorrer do relacionamento.
“Na vida, só se pode compartilhar quando, elaboradas as perdas,
se criam vínculos... vínculos afetivos, ideativos... morais e
filosóficos. A estes vínculos eu chamo de engajamento.
Engajamento exige renúncia a posturas narcisistas alienantes da
realidade, mobiliza a necessidade de compromisso, de respeito
mútuo e solidariedade social.” (THIERS, 1998, p. 309).
Na rotina da clínica, tanto na terapia individual quanto de casais,
o que vemos são indivíduos com esse tipo de queixas, de que espera
demais do outro, das faltas que o outro comete na relação com ele.
São histórias de relações entre indivíduos com referências parentais
que não corresponderam aos desejos, resultando em permanência de
sentimentos de angústia, na espera de realizações através do outro,
que lhe complemente essas faltas nos relacionamentos.
São histórias de não aceitação de perdas, de fragilidade e sensação
de impotência diante da vida, da percepção dessas faltas primárias,
que muitas vezes não podem ser reparadas por estarem projetadas em
outros indivíduos, também fragilizados, e que não poderão
corresponder a contento.
Sobre o casamento:
Através dos tempos, o casamento vem adquirindo sentidos
diferenciados. Até o século 19, não vinha à cabeça do homem nem da
mulher procurar a felicidade no casamento.
“Casavam-se porque isso fazia parte da necessidade social, e se
acontecia de não serem demasiado infelizes era ordem do acaso.”
(MELMAN, Charles,In CALLIGARIS, 1999, p.81)
Hoje, diferentemente, todo casamento tem como primeiro objetivo de
cada indivíduo: ser amado e ser feliz.
“Nossa conjugalidade é sempre um ménage-à-trois, por ser uma
relação onde a insatisfação é convidada a ser sublimada, já que,
mais frequentemente, é preciso educar as crianças, continuar a
cadeia de gerações ou às vezes, por razões sociais, o homem e a
mulher se resignam e suportam essa insatisfação.” (MELMAN,
1999.).
O real do casamento, então, é conviver com a insatisfação de não ter
as expectativas de felicidade realizadas. Relacionado com as faltas
ou frustrações, podemos pensar que elas representam fatores que nos
impulsionam para o crescimento emocional. Nossa mãe, suficientemente
boa, não nos preencherá plenamente. Para nosso crescimento emocional
será necessário sairmos da dependência, estabelecendo um desejo e
buscar satisfação. E ainda assim, ao realizarmos nosso desejo,
provavelmente partiremos para mais uma busca de realização, e assim
infinitamente, num constante crescimento.
Por outro lado, há que se buscar um equilíbrio, entre o real e a
fantasia. Fantasiar é colocar a graça de viver nos relacionamentos.
Projetar no outro nossos aspectos positivos de afeto, o aprendizado
de colocar-se no lugar do outro, como forma de equilibrar os desejos
de dar e receber, propiciando um ciclo mais harmonioso no
relacionamento.
Assim como hoje a busca pela terapia conjugal está mais frequente,
as decisões por terminar o relacionamento também são opções mais
vistas no meio social. O papel do terapeuta é colaborar para que a
decisão tomada seja a melhor para as duas partes, de modo que se
possam reestruturar posteriormente relações familiares que
possibilitem novos e melhores tipos de realização emocional.
A história do casamento de Freud e correlações com sua obra sobre o
relacionamento.
Relatar uma parte da história do casamento de Sigmund Freud, o
precursor da psicanálise tornou-se oportuno, pois nos permite o
conhecimento de questões do relacionamento vivenciado por ele que se
vincularam aos conceitos teóricos que formularia mais tarde.
O romance entre Freud e Martha Bernays foi registrado em mais de 900
cartas, em parte recuperadas e organizadas pelo filho Ernst. Freud
encontra Martha aos 26 anos e viveu um autêntico amor à primeira
vista, intensamente apaixonado, entre o primeiro encontro e o
noivado foram dois meses. Em quatro anos e três meses de noivado,
ficaram separados três anos, o que justifica a forma de comunicação
descrita.
Uma das primeiras deduções de Freud sobre o amor é que ele consiste
no ideal do ego, ou seja, o enamorar é essencialmente narcísico,
quando escreveu sua Introdução ao narcisismo, texto de 1914, propõe
o amor objetal e o narcísico, assinalando a busca da imortalidade do
eu através de uma completude ilusória, efemeramente conseguida pelos
apaixonados.
Escreveu para Martha: “Sou realmente
meia pessoa no sentido da velha fábula platônica que você certamente
conhece, e desde o momento em que não estou em atividade meu corte
dói”.(BUENO, 1994, p. 42).
No texto sobre o Narcisismo, conceitua-se a auto-estima como a
expressão de magnitude do eu, com ligação com a libido narcísica.
Ser amado, então, constitui-se o fim e a satisfação na escolha
narcisista de objeto, uma intensificação da auto-estima,
enquanto que amar produz um esvaziamento. O ser falante cria uma
imagem ideal, tanto de si como de seu objeto amoroso, que vem
justamente completar o que falta ao eu para chegar a esse ideal
sonhado. Por isso é dito que se ama no outro a própria carência.
(BUENO, 1994, p. 43).
Freud, porém, não se mantém assim, primitivamente narcisista, passa
a se reconhecer e ter Martha como suporte e referência para seu
trabalho. Diz: “Fiquei encantado ao saber que você tem tantas
ambições por mim, minha doce menina: a princípio eu não as tinha...Você
me dá não apenas ideal e sentido, mas também tanta felicidade que
não posso estar insatisfeito com o presente sob outros aspectos algo
infeliz; você me dá esperança e certeza de sucesso.”
As ideias de Freud sobre os movimentos de emancipação feminina eram
claras, tendo criticado o pensamento de John Stuart Mill, pela falta
de senso do filósofo em não reconhecer a diferença entre homem e
mulher,coloca-se em relação ao complexo de Édipo e a consequente
diferença na escolha do objeto, sendo que, a partir daí é que é
moldado o caráter da mulher como ser social. O precursor da
Psicanálise refere-se à escolha do objeto amoroso como uma
substituição do objeto de desejo personificado originalmente na mãe:“muitas
mulheres escolhem seu marido de acordo com o modelo do pai ou o
colocam no lugar deste; mas, no matrimônio, repetem com esse marido
a má relação com a mãe.” 1936, Sobre a sexualidade feminina.
Ou: “o matrimônio mesmo não fica garantido até que a mulher tenha
conseguido fazer de seu marido seu filho e atuar com ele como mãe.”
1937, sobre a Feminilidade.
E assim foi, Freud vivenciando seu laço conjugal com Martha como um
fim sonhado em que nada poderia separá-los, sem iludir-se quanto à
paixão vulnerável, descreve um ideal conjugal, de cumplicidade e
esperança de complementaridade:
“Não temos a intenção de partilhar o prazer doloroso de paixões
agitadas, temos um objetivo prático: viver e trabalhar juntos numa
união íntima à deux e um pouco mais livre com outros casais e
sentimo-nos com o direito de dispensar tudo o que consideramos
inútil para esse fim.”
“Aceitamos uma missão difícil e para cumpri-la devemos apoiar e
emendar um ao outro. Palavras de amor apenas não podem realizar isso;
viver juntos não significa esconder coisas desagradáveis de outro ou
passar por cima delas; ajudar o outro significa partilhar tudo que
se nos depara.”
Vivenciaram os dois, Freud e Martha, um modelo de casamento
indissolúvel, onde ela, enquanto personagem real foi esposa,
companheira de vida e mãe de seus filhos. Para Freud, ela
representou ainda uma criação, uma figura de discurso, um ideal de
união complementar que permeava os motivos que impulsionaram sua
obra. O casamento teve sua marca inicial em 14 de setembro de 1886 e
eles viveram juntos até o fim da vida.
Casal Freud jovem
Casal Freud idoso
As questões relacionadas com a comunicação no relacionamento
conjugal podem estar associadas a diferenças básicas entre homem e
mulher.
Solange Thiers, em seu escrito sobre “A compreensão do sujeito
psíquico pela abordagem psicanalítica”, texto integrante do
Orientador CR, faz a leitura de Freud no que se refere às diferenças
na vivência edipiana no menino e na menina. A formulação de Freud
coloca no centro do complexo de Édipo o complexo da castração. Para
o menino, acontece vivência da angústia da castração em função da
ameaça paterna à sua sexualidade. Para a menina a castração é vista
como um fato consumado, não entendendo a falta do pênis como uma
diferença de caráter sexual. Assim, a menina não vive o temor da
castração, vive mais o Édipo como uma ameaça da perda de amor.
“É uma grande batalha, a do homem, para constituir-se como homem,
pois o primeiro dever dele desde que nasce é não ser uma mulher.
Para os meninos, separação e individuação acham-se vinculados a
identidade de gênero, visto que a separação da mãe é essencial
para o desenvolvimento da masculinidade. A masculinidade se
define através da separação, enquanto a feminilidade através do
apego, a identidade de gênero masculina é ameaçada pela
intimidade, ao passo que a identidade feminina é ameaçada pela
separação.” (GRANATO, Rita, 2008).
“o senso de identidade do homem baseia-se principalmente na
realização de objetivos econômicos e sociais, mais do que nas
relações pessoais e, por isso, dar aos outros não é parte
importante de sua auto-imagem, como é para as mulheres. Embora
interessados em serem maridos e pais, a confirmação de sua
masculinidade vem, sobretudo, do papel que desempenha fora da
família e de sua posição de liderança. Comumente, o sucesso no
mundo do trabalho exige repressão dos sentimentos, capacidade de
dominar paixões e fraquezas e de desenvolver um comportamento
controlado e preciso. Isso frequentemente leva a eliminar amplas
áreas de sensibilidade e a inibir a resposta às necessidades do
outro.” (ANDOLFI, 2002).
Torna-se muito difícil ignorar a influência de tais diferenças no
relacionamento dos casais. As desigualdades entre homem e mulher
repercutem de modo importante. A mulher desenvolve modelos de
comunicação indiretos, como explosões de raiva, choro, dissimulação,
ou mesmo apresenta sintomas. O homem fica muitas vezes confuso,
sentindo-se incapaz de responder adequadamente a essa emotividade. A
mulher muitas vezes requer uma maior proximidade e como resposta o
homem se distancia pela dificuldade de compreensão. Podemos
considerar isso como resultado do aprendizado, dacultura, muito mais
do que fenômeno patológico. Permanecer atento, portanto, possibilita
maior acesso do terapeuta à história de sofrimento do casal.
Ramain-Thiers- propostas utilizadas na terapia de casal
Ramain-Thiers apresenta pressupostos básicos para aplicação de
propostas de psicomotricidade diferenciada em nossa formação como
sociopsicomotricistas, o que nos permite uma aplicabilidade nos
diversos enfoques que a demanda da clínica psicológica apresenta.
O elementarem Ramain-Thiers é o enfrentamento do erro, o
reconhecimento da falha, o assumir a responsabilidade pela própria
ação, que leva cada indivíduo a uma atitude de crescimento e
aceitação do outro.
Na terapia com casais não acontece diferente.
O casal é convidado a uma ação, que é a elaboração de uma proposta
de psicomotricidade diferenciada, que promove uma necessidade de
negociação na busca de realizar o que pede a proposta, provocando o
diálogo entre eles, o que muitas vezes já não ocorre no dia a dia.
A leitura terapêutica é feita conforme a verbalização observada após
o trabalho, os embates que acontecem durante a realização costumam
render conteúdos esclarecedores referentes à dinâmica do
relacionamento. No momento da verbalização do casal e da
clarificação por parte do terapeuta, pode acontecer o que poderia
ser chamado de uma tradução do que um diz para o outro, pois,
às vezes, cada um está tão absorto em seu ego que não consegue ouvir
o parceiro, mesmo durante a tarefa proposta.
Características das propostas de psicomotricidade diferenciada que
podemos escolher para aplicar:
a)
Propostas que possibilitem encaixes;
b)
Que possuam um nível médio de dificuldade;
c)
Que permitam o trabalho em dupla;
d)
Que requeiram negociação;
e)
Que estimulem consenso nas escolhas de material;
f)
Que estimulem a criatividade.
Propostas utilizadas até o momento:
Orientador E: Conj.05/07, As folhas entrelaçadas; Conj.16/11, A
moldura decorada; Conj.08/9, Caleidoscópio.
Orientador E, conj.5/7 As folhas
entrelaçadas
Cada um deve copiar a folha no papel quadriculado, depois recorta o
contorno e, dando picos nos traçados internos da folha, possibilitar
o encaixe das duas folhas. O encaixe será possível quanto mais
comunicação existir entre o casal, a proposta trabalha a necessidade
de ceder espaço de si para que o outro possa participar da relação.
No exemplo acima, o casal faz um único picote, central, e o encaixe
se faz por sobreposição. Era um casal em reinício de relacionamento,
reaprendendo a ceder, cada um o seu espaço para o outro. Haver uma
atitude de evitar muitos picotes.
Orientador AD: Conj.15/16, As aves no
jardim.
As aves no jardim é uma proposta que envolve recorte das aves (trabalhando-se
as perdas) e a construção de uma cena, estimulando a criatividade.
Tendência ao individualismo, com cada um fazendo sua parte sem
consultar o outro, bem como dificuldade de ouvir a sugestão do
parceiro foram traços observados na elaboração das propostas.
Orientador E conj. 16/11 A moldura
decorada.
O casal é orientado a codificar sinais e cores, posteriormente
fazendo a cópia dos sinais em quadrados de cores diferentes para
cada um, ao final, colar os quadros de modo cruzado, formando um
todo. Observados sinais de competitividade e tentativa de controle
do parceiro, opinando e cuidando para que o erro do outro não
comprometa o resultado. Abre discussão para a dificuldade de
comunicação ou de atitude consensual na relação, uma vez que a
proposta trabalha escolhas e estimula o diálogo para codificar os
sinais e cores.
Orientador E, conj.8/9, Caleidoscópio
A orientação para que seja feita escolha de formas para serem
copiadas e vazadas no círculo, possibilita ao casal a vivência da
atividade criativa. Observado no casal da proposta em questão,
atitude de passividade por parte da esposa, deixando o papel de
escolha por conta dele. Como a queixa apresentada havia sido
referente à atitude de autonomia reduzida por parte dele, a
verbalização possibilitou esclarecimentos acerca de posturas
passivas que deixam o relacionamento fragilizado e propenso a
conflitos.
Ainda podemos utilizar propostas de Artes e Semi-diretivas, tendo
como tema desenhos livres ou colagens.
Abaixo, uma proposta de desenho livre, onde a mulher se ocupa em
fazer a quase totalidade do desenho, demonstrando uma característica
dominadora na relação. Ao final, coube a ele concluir o desenho, e
sua participação resumiu-se a desenhar os pássaros... O casal tinha
um filho, aqui representado junto da mãe, são dois coqueiros. O pai,
representado pela árvore do outro lado de um abismo.
Expresso aqui o conflito do casamento, a história do casal resultou
em separação, pela extrema dificuldade de aceitação entre eles.
Trabalhar com casais utilizando Ramain-Thiers dimensionou uma forma
de escuta cuidadosa e continente, de modo a fazer, do resultado do
trabalho observado, uma leitura particular do desejo de cada um,
demonstrando, pela natureza do trabalho de psicomotricidade que,
ainda que diferentes no modo de sentir o mundo, cada um pode
trabalhar junto com o outro, aceitando o modo de agir e sentir do
parceiro de caminhada.
Ramain-Thiers propicia um momento de ação segura e eficaz, na busca
de um resultado que pode mostrar ao casal a possibilidade de
crescimento no relacionamento.
Referências:
ALVARENGA, Lidia Levy. Na escuta
do laço conjugal. PUC. Rio de Janeiro: EditoraEdibral,.
ANDOLFI, Maurício. O casal em
crise. Porto Alegre: Artmed, 2002.
BUENO, Cleuza Maria de Oliveira. O
casal Freud. Porto Alegre: APPA, 1994.
CALLIGARIS, Contardo. O laço
conjugal. APPA. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999.
EIGUER, Alberto. Um divã para a
família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1985.
FREUD, Sigmund . Obras completas.
Rio de Janeiro: Imago, 1976.
GRANATO, Rita. Questões do
masculino: formação da identidade masculina. Artigo da Revista
de Psicologia, 2008.
HERZOG, Regina. Os sintomas nas
relações amorosas. Rio de Janeiro: Casa do Saber, 2009.
THIERS, Solange.
Sociopsicomotricidade: uma leitura emocional, corporal e social.
2 ed. Ver. São Paulo:Casa do Psicólogo, 1988..
THIERS, Elaine. Org. Compartilhar
em Terapia: seleções em Ramain-Thiers. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 1998. |