Vol. V: Vitrais 70 - mar 2013
A Revista da ABRT Associação Brasileira Ramain-Thiers - ISSN 2317-0719
 
     
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VITRAIS
Vol. V: Vitrais 70

                          mar 2013

 

Editorial

Notícias

Entrevista
Resumos do V Congresso Brasileiro da Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers


Artigos

Eliana Júlia B.Garritano

Mara Lutz

Benilde F. Assunção Farias

 

Reflexões

Vinívius de Morais

Fernando Pessoa


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Artigo

 

Adolescência:

Identidade x Profissão


 

 

Mara Lutz

 

Psicóloga. Enfermeira. Sociopsicomotricista Ramain-Thiers. Mestranda em Psicologia. Autora: O Universo das Convivências. Consultora Empresarial.

 

           Antes, porém, de discorrer sobre o caso clinico é necessário algumas explicações e observações iniciais: procuro trabalhar com a família, pois percebo que ela se trabalhada e orientada, pode ser uma coadjuvante no resgate da saúde do filho, sei porem, que existem riscos tanto no buscá-los como aliados, quanto permanecer somente com o cliente, pois nem sempre conseguimos detectar o limite de tolerância do mesmo, ao lidar com determinados graus de frustrações, por isso percebo que o terapeuta, precisa estar muito consciente naquilo que acredita e em que momento atuar e de que forma, assim como buscar sabedoria Divina. Até me atreveria dizer que este é um dos grandes riscos da profissão, detectar estes momentos, para poder atuar neles.

           As questões iniciais basearam-se nos seguintes dados:

·         A apresentação deste estudo de caso envolveu os seguintes dados: TSS, 25 anos de idade, formada em Direito, passou nas duas provas da Ordem dos Advogados, solteira, iniciou o Tratamento Psicológico em Novembro de 2010, na cidade de Campo Grande- MS.

·         Queixas principais: Dúvidas na área profissional, tanto em relação à escolha, quanto ao “choque” de valores, ao se deparar com determinadas situações profissionais, conflitos pessoais, sociais e familiares, dificuldade de ser “julgada”, ficou desempregada, teve um aumento de peso em 20 Kg, desmotivação e labilidade emocional acentuada, depressão desde criança e pai também com história de depressão.

·         Mecanismos de Defesa, Sentimentos e Atitudes Observadas: isolamento, formação reativa, projeção, Negações eventuais, Hostilidade para consigo mesma e para com os outros.

·         Características gerais observadas no encontro com pais e TSS, no momento da devolutiva: Pai: falava pouco, dificuldades afetivas na relação com filhos, esperava “sempre” pela iniciativa da esposa; Mãe: dominadora, protetora e intermediadora, diante da observação apresentava comportamentos de desconfiança e olhar interrogativo; TSS- Chorava quase o tempo todo.

·         A base do trabalho: Metodologia Ramain-Thiers.

·         Motivadores para mudanças de categorias: foram as percepções das necessidades ou o aparecimento de mecanismos de defesas específicos (por exemplo, formação reativa) bem como a interpretação da própria verbalização e solicitação de TSS.

           O trabalho psicológico com TSS envolveu dúvidas e hipóteses iniciais, para isto pensou-se na possibilidade de estar havendo interferências de uma simbiose tardia no processo emocional de TSS e os vários momentos da psicoterapia foram sendo escolhidos de acordo com determinadas “urgências” em que se procurou estabelecer objetivos específicos e é importante salientar que nesse período a prioridade foi a terapia individualizada, mas eventualmente iam sendo trabalhadas outras necessidades de forma diferenciadas.

           De acordo com Braier (1991): “[...] em muitas ocasiões uma terapia de objetivos e tempo limitados pode ser o passo inicial em direção a um posterior tratamento, [...] que poderá trazer, como resultado, uma mudança nas condições do paciente que o torne apto para efetuar, em seguida, uma psicoterapia prolongada”.

           Em função de todas estas questões o processo acabou desenvolvendo-se da seguinte forma, tanto em relação a atuação, quanto a objetivos e o mesmo apresentou-se da seguinte forma: a) Orientação Profissional – Objetivo: Tentar dirimir as dúvidas quanto a escolha profissional (que foi o motivo que trouxe a cliente ao consultório); b) Trabalho Individual - Objetivo: Desenvolver a terapia propriamente dita; c) Trabalhos Eventuais com os Pais - Objetivo: Perceber a dinâmica familiar e tentar clarear algumas questões que se fizessem necessárias (sendo realizado um encontro por mês num total de dois); d) Trabalho com TSS e Mãe - (uma vez ao mês e que acabou ocorrendo num total de três encontros, sendo que após este período ela não tolerava mais a situação, percebendo-se desta forma que ela estava desenvolvendo limites) – Objetivo: Perceber o vínculo e lidar em algumas questões possíveis; e) Resgate do Trabalho Individual - Objetivo: Continuar a terapia propriamente dita; f) Trabalho com o pai - (uma vez ao mês, sendo que ele só veio em um)- Objetivo: Tentar uma reaproximação de TSS com o pai, pois era possível perceber esta necessidade em relação a ela; g) Trabalho Grupal - Procurar trabalhar mais profundamente o sentido de realidade, fato este que o pai teve dificuldade.

           As escolhas fazem parte da vida e a todo momento elas acompanham os indivíduos, mas como fazer estas escolhas envolvem atos que em algum as vezes necessitam estar mais claros e conscientes e um desses momentos é o da Escolha Profissional.

           Por esta razão, procurou-se iniciar pela Orientação Profissional, pois alguns esclarecimentos precisavam ser clareados, devido a cliente chegar com muitas dúvidas: “será que escolhi a profissão errada?”; ao mesmo tempo em que ela mesma, dizia: “[...] eu não gostaria de desistir de tudo, eu já tenho meus colegas”, verbalizações estas que demonstram conflitos emocionais.

           Ela havia escolhido uma profissão (Advocacia) que costuma apresentar um perfil característico, entre eles: autoconfiança, assertividade, capacidade persuasiva, consciência sobre necessidade de defender, ser julgado e julgar, entre outras.

           Já as características de comportamento e de personalidade de TSS envolviam “quase tudo” contrário a este perfil, como: falta de iniciativa e decisão, dificuldade em lidar com frustrações, autopunição e autopiedade, muito influenciada por decisões da mãe, pouco diálogo com o pai e mãe, referia querer “poupá-los” de suas questões emocionais, rivalidades com a irmã, labilidade emocional acentuada, desvalorização de suas próprias capacidades.

           Após esta fase inicial, percebeu-se que o seu Desenvolvimento Psicossexual (Freud), em relação TSS e a profissão, a primeira apresentava-se na fase oral-anal e a segunda na fase fálica- genital, ou seja, a idade cronológica não acompanhava a idade emocional e o desempenho profissional exigia um processo emocional mais amadurecido.

           A cliente já havia feito terapia em outras ocasiões e ela fez a seguinte afirmação em relação as mesmas: “[...] toda a vez que eu começava a me posicionar diante dos meus pais, a mãe me tirava da terapia [...]”, fato este que também pode ser percebido algumas vezes no processo atual, o que me levou a pensar que talvez estivesse havendo algum tipo de ganho emocional na atitude da mãe, o que foi possível ficar mais claro durante as atividades desenvolvidas entre mãe e filha.

           Por estas razões percebi a necessidade de utilizar algumas questões, a fim de contribuir na superação das dificuldades emocionais da paciente e para isto ela precisaria superar algumas questões: como dificuldades no processo de individuação e necessidade da interdição, entre outras.

           Os filhos que se mantém na dependência dos pais, além do período necessário, acabam por se tornar inseguros, sem criatividade e iniciativa, devido a sentimentos como o medo, o que acaba interferindo sobremaneira na autonomia e confiança própria.

           De acordo com Silva (apud Knobel, 2003): “Para atingir a maturidade é necessário ter individualidade e independência reais. A separação progressiva dos pais, a entrada na turma, e a posterior individualização discriminativa são passos necessários do processo evolutivo humano”, [...] , “As instabilidades são necessárias e devem ser superadas”.  

           TSS- sentia-se cobrada, passava imagem de que estava tudo bem e em uma das declarações se posicionou da seguinte forma: “[...] acho que fui ensinada a não reagir [...], pode ser por medo de rejeição, punição [...]”.

           Foi escolhido como base deste trabalho por que ele contribui como a entrada do pai na relação entre mãe e filho, num sentido de fazer uma interdição, favorecendo a entrada do limite.

           Em se tratando de Lobo, Mazzolini e Castro (in Thiers, 2001): “[...] o Método Ramain-Thiers é um instrumento clínico que permite a visualização e a compreensão de fenômenos psíquicos do sujeito”.

           Estarei citando apenas alguns momentos da terapia de TSS, através de alguns Orientadores, que acredito que facilitarão a compreensão do caso e procurarei dividir em categorias, são elas:

·         CATEGORIA INDIVIDUAL: (durante a orientação profissional e posterior a ela)

AD 14 aves-

Para Thiers, (1992): “[...] Caracterizado por um grau de maturidade, [...] fase que faz com que os adolescentes, [...] caminhe para o mundo adulto, [...] elaboração de fixações, condição de dar e receber, satisfazer-se [...] reencontrar-se com questões danificadas”.

Esta atividade envolveu escolhas e para que elas ocorressem de forma mais segura é necessário um desenvolvimento emocional, o que nem sempre é realidade.

No caso específico de TSS, após aplicação da técnica específica a mesma apresentou as seguintes falas significativas: “[...] o erro estragou [...]”, “[...] minha irmã sabe pintar [...]”, “[...] mãe acha que não levo jeito, [...] ela define: você sabe [...] você não sabe [...]”, estas verbalizações facilitam a percepção de que as cobranças pessoais eram intensas, baixa-estima, rivalidades e intenso significado nas palavras maternas, ou seja, ainda estava mostrando o processo de individuação não estava finalizado. É importante esclarecer que 80% do período de tratamento foi individual, todas as atividades desenvolvidas por ela era com bastante dedicação, sua verbalização fluía naturalmente, ela conseguia perceber questões importantes que diziam respeito a sua dinâmica pessoal, mas a fala dos pais em relação a ela eram absorvidas de forma intensa, por isso que senti necessidade de trazê-los em alguns momentos, a fim de compreender melhor estas questões emocionais que envolviam a situação.

Procurei citar em forma de categorias, por terem sido estes momentos por demais significativos.

 

  CATEGORIA DUPLA COM A MÃE

E 600-18 –

TSS- “Vejo a mãe como forte, [...] negativa... preciso de sua avaliação, [...] uma acaba interferindo demais na vida da outra [...]”.

Nesta atividade percebeu-se que existiam dificuldades com relação a limites, tanto da parte de uma, quanto da outra e o fato de TSS não ter colado e a mãe sim, isto facilitou a percepção de questões que se relacionavam a ela própria, o que ela pode verbalizar através das seguintes palavras: “[...] mexeu comigo não ter fixado”, era uma de suas tendências a concluir suas atividades.

  CATEGORIA BASEADA NA TENTATIVA DE DUPLA COM O PAI

Ele só veio em um dos encontros, nos demais sempre havia motivos que o impediam de comparecer.

 

·         TENTATIVA DE SUICIDIO

           Acontecimentos próximos a tentativa de suicídio que envolveu as seguintes falas: “[...] tenho minhas coisas para fazer”; [...] “Eu sempre fico para depois” “[...] pai não leva nada adiante do que combina” (ele havia combinado que viria para fazer o trabalho com a filha na psicologia e não veio).

           Na época, TSS já estava se tornando assertiva, facilidade no entrosamento social, desenvolvendo maior percepção das intenções alheias e começando a questionar as atitudes dos pais, mas continuava dependendo financeiramente para as mínimas coisas e sua fala envolveu os seguintes dados: “[...] tenho que deixar de fazer minhas coisas para fazer a deles, [...] percebo cisma dos pais para comigo, [...] pai quer parecer maior que os outros, [...] falsa humildade [...] não querem dar dinheiro pra nada, agora qualquer coisa vou cobrar, [...] a aula de dança tem me ajudado muito”.

           Esta questão fez-me pensar o quanto a tolerância para determinadas questões ou frustrações é extremamente relativa e nem sempre percebida, tanto pela própria pessoa, quanto pelos que estão próximos a ele, fatos estes que com o passar do tempo podem se tornar intoleráveis a ponto de ocorrer a desistência da vida pelo individuo.

           Em torno de uma semana depois a paciente tentou suicídio, só a mãe que ficou sabendo da tentativa, o pai achou que era da própria depressão, ela não permitiu a mãe falar para ele o que havia acontecido, mas falou o quanto a filha estava adoecida e precisava da ajuda dele.

O suicídio está associado com necessidades frustradas, ou não satisfeitas, sentimentos de desesperança e desamparo, conflitos ambivalentes entre a sobrevivência e o estresse insuportável, um estreitamento das opções percebidas e uma necessidade de fugir; a pessoa suicida emite sinais de angústia”. (Kaplan e Sadock, 1993).

           Após o fato, o pai fez questão de fazer alguns encontros com a filha.

·         CATEGORIA BASEADA NA SOLICITAÇÃO DO PAI PARA A DUPLA COM A FILHA

Como se falou no início deste trabalho as duplas ocorreriam uma vez no mês durante uns três encontros somente.

Nesta fase específica se iniciou atividades voltadas para o lado lúdico e depois para as técnicas Ramain-Thiers.

No encontro posterior ela solicitou iniciar o trabalho grupal e não quis mais continuar com o pai, fato este que já vinha sendo trabalhado como possibilidade já há algum tempo.

Em uma das atividades com o pai, utilizou-se um momento terapêutico que pode ser enquadrado entre o Conjunto, CR-18, através da história que contou para a filha, a mesma, no RT é vista como algo que promove projeções e identificações com os personagens, desenvolve a expressão verbal, em adaptação a Freud promove a expressão da ambivalência afetiva, substituição Regressiva. Em sequência o Conjunto, CR-19, Atividades Livres, em que foram produzidos vaquinhas com um legume chamado maxixe e Conjunto, CR-20, na proposta voltada para trabalhos manuais, onde se utilizou palitos para a confecção das vaquinhas.

      Esta atividade foi a última com o pai. Ali ela pode conhecer um pouco da história do pai, da infância que ele não teve, onde ele pode referir que: “nunca podia brincar por que não dava tempo”, percebeu um pai que tinha sentimento (ele chorou bastante), onde ela pode perceber as intenções dos pais na proteção excessiva: “[...] no intuito de fazer o melhor acabamos protegendo [...] é sempre tempo de mudar e corrigir alguma coisa [...] a gente sempre aprende [...]” e ela: “[...] é angustiante quando venho com ele, mas depois da certo alívio [...] é importante a presença dele para mim [...]”.

·         CATEGORIA GRUPO PARCIAL

Conj. E – 15, Revoada de Borboletas- são consideradas propostas genitais por que tem partes orais, anais, fálicas e pretendem inserir o individuo nos grupos sociais, saindo da tríade e aprendendo a viver em coletividade. Por mais que seja uma atividade genital, não significa que haverá uma maturidade, pois as evoluções são individuais.

Nesta atividade específica deu para perceber tendências autopunitivas, em um processo diferente, pois havia tentativa de superação.

           De acordo com Silva (apud Knobel, 2003): “A medida que o desenvolvimento vai acontecendo” o individuo vai se tornando” mais seguro e mais independente, busca se “independizar” dos pais e passa a buscar identificações fora do grupo familiar”.

           Através deste caso pude perceber determinadas questões que para minha vida profissional que foram de grande significado como: o fato de sermos escolhidos pelo cliente, para caminharmos com ele através de suas autorizações e capacidades emocionais, estas são  situações de  extremo privilégio; necessidade da consciência  éticas, bem como levar em conta nossos  propósitos e limitações profissionais; necessidade DIÁRIA de SABEDORIA DIVINA.  

           Portanto, o vínculo de confiança, consideração e respeito é algo que permanecerá independente da finalização do tratamento emocional, esta é uma fase da vida do paciente que ficará gravada tanto na mente dele, quanto na nossa.  

 

Bibliografias 

BRAIER, Eduardo Alberto. Psicoterapia Breve de Orientação Psicanalítica. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

GRUBITS, Sonia. Identidade, Identificação: construção do ser social e da cidadania. Revista de Psicologia da Vetor Editora. Apud ERIKSON, E. H. Identidade, Juventude e Crise. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.

KAPLAN, H. I. & SADOCK, B.J. Compêndio de Psiquiatria. Porto Alegre, 1993.

LOBO, A.L. M; MAZZOLINI, B.P. M, CASTRO, M.C. S de. A Entrada da Função Paterna Através do Ramain-Thiers in A Essência dos Vínculos. Thiers, Solange e Thiers, Elaine. Rio de Janeiro: Altos da Glória, 2001.

SILVA, Paulo Sergio. A Formação do Eu: a busca de autonomia e o desenvolvimento da maturidade. São Paulo: Expressão & Arte, 2003.

THIERS, Solange. Orientador Terapêutico para Crianças – CR. Rio de Janeiro: CESIR, Biblioteca Nacional, Reg. Nº 75.307, 1992.

__________Orientador Terapêutico Thiers para Adolescentes – AD. Rio de Janeiro: CESIR, Biblioteca Nacional, Reg. N 79695, 1992.

__________Orientador Terapêutico Thiers S para Adultos – E. Rio de Janeiro: CESIR, Biblioteca Nacional Reg. N 74486, 1992.1ª ed. e N 75307, 1995. 2ª ed.

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Uma leitura em Ramain-Thiers

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